sexta-feira, 25 de março de 2011

XII DOMINGO TEMPO COMUM

* DOMINGO


«Mas àquele que me negar diante dos homens,
também Eu o negarei diante do meu Pai que está nos Céus»


LEITURA I – Jer 20,10-13

Leitura do Livro de Jeremias Disse Jeremias: “Eu ouvia as invectivas da multidão: ‘Terror por toda a parte! Denunciai-o, vamos denunciá-lo!’ Todos os meus amigos esperavam que eu desse um passo em falso: ‘Talvez ele se deixe enganar e assim poderemos dominar e nos vingaremos dele’. Mas o Senhor está comigo como herói poderoso e os meus perseguidores cairão vencidos. Ficarão cheios de vergonha pelo seu fracasso, ignomínia eterna que não será esquecida. Senhor do Universo, que sondais o justo e perscrutais os rins e o coração, possa eu ver o castigo que dareis a essa gente, pois a Vós confiei a minha causa. Cantai ao Senhor, louvai o Senhor, que salvou a vida do pobre das mãos dos perversos”.

LEITURA II – Rom 5,12-15

Irmãos: Assim como por um só homem entrou o pecado no mundo e pelo pecado a morte, assim também a morte atingiu todos os homens, porque todos pecaram. De facto, até à Lei, existia o pecado no mundo. Mas o pecado não é levado em conta, se não houver lei. Entretanto, a morte reinou desde Adão até Moisés, mesmo para aqueles que não tinham pecado por uma transgressão à semelhança de Adão, que é figura d’Aquele que havia de vir. Mas o dom gratuito não é como a falta. Se pelo pecado de um só pereceram muitos, com muito mais razão a graça de Deus, dom contido na graça de um só homem, Jesus Cristo, se concedeu com abundância a muitos homens.

EVANGELHO – Mt 10,26-33

Naquele tempo, disse Jesus aos seus apóstolos: “Não tenhais medo dos homens, pois nada há encoberto que não venha a descobrir-se, nada há oculto que não venha a conhecer-se. O que vos digo às escuras, dizei-o à luz do dia; e o que escutais ao ouvido proclamai-o sobre os telhados. Não temais os que matam o corpo, mas não podem matar a alma. Temei antes Aquele que pode lançar na geena a alma e o corpo. Não se vendem dois passarinhos por uma moeda? E nem um deles cairá por terra sem consentimento do vosso Pai. Até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados. Portanto, não temais: valeis muito mais do que os passarinhos. A todo aquele que se tiver declarado por Mim diante dos homens também Eu Me declararei por ele diante do meu Pai que está nos Céus. Mas àquele que me negar diante dos homens, também Eu o negarei diante do meu Pai que está nos Céus”.

Reflexão

O tema central da nossa leitura é sugerido pela expressão “não temais”, que se repete por três vezes ao longo do texto (cf. Mt 10,26.28.31). Trata-se de uma expressão que aparece com alguma frequência no Antigo Testamento, dirigida a Israel (cf. Is 41,10.13; 43,1.5; 44,2; Jer 30,10) ou a um profeta (cf. Jer 1,8). O contexto é sempre o da eleição: Jahwéh elege alguém (um Povo ou uma pessoa) para o seu serviço; ao eleito, confia-lhe uma missão profética no mundo; e porque sabe que o “eleito” se vai confrontar com forças adversas, que se traduzirão em sofrimento e perseguição, assegura-lhe a sua presença, a sua ajuda e protecção.
É precisamente neste contexto que o Evangelho deste domingo nos situa. Ao enviar os discípulos que elegeu, Jesus assegura-lhes a sua presença, a sua ajuda, a sua protecção, a fim de que os discípulos superem o medo e a angústia que resultam da perseguição. As palavras de Jesus correspondem à última bem-aventurança: “bem-aventurados sereis quando, por minha causa, vos insultarem, vos perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós” (Mt 5,12). Este convite à superação do medo vai acompanhado por três desenvolvimentos.
No primeiro desenvolvimento (vers. 26.27), Jesus pede aos discípulos que não deixem o medo impedir a proclamação aberta da Boa Nova. A mensagem libertadora de Jesus não pode correr o risco de ficar – por causa do medo – circunscrita a um pequeno grupo, cobarde e comodamente fechado dentro de quatro paredes, sem correr riscos, nem incomodar a ordem injusta sobre a qual o mundo se constrói; mas é uma mensagem que deve ser proclamada com coragem, com convicção, com coerência, de cima dos telhados, a fim de mudar o mundo e tornar-se uma Boa Nova libertadora para todos os homens e mulheres.
No segundo desenvolvimento (vers. 28), Jesus recomenda aos discípulos que não se deixem vencer pelo medo da morte física. O que é decisivo, para o discípulo, não é que os perseguidores o possam eliminar fisicamente; mas o que é decisivo, para o discípulo, é perder a possibilidade de chegar à vida plena, à vida definitiva… Ora, o cristão sabe que a vida definitiva é um dom, que Deus oferece àqueles acolheram a sua proposta e que aceitaram pôr a própria vida ao serviço do “Reino”. Os discípulos que procuram percorrer com fidelidade o caminho de Jesus não precisam, portanto, de viver angustiados pelo medo da morte.
No terceiro desenvolvimento (vers. 29-31), Jesus convida os discípulos a descobrirem a confiança absoluta em Deus. Para ilustrar a solicitude de Deus, Mateus recorre a duas imagens: a dos pássaros de que Deus cuida (que revela a tocante ternura e preocupação de Deus por todas as criaturas, mesmo as mais insignificantes e indefesas) e a dos cabelos que Deus conta (que revela a forma particular, única, profunda, como Deus conhece o homem, com a sua especificidade, os seus problemas, as suas dificuldades). Deus é aqui apresentado como um “Pai”, cheio de amor e de ternura, sempre preocupado em cuidar dos seus “filhos”, em entendê-los e em protegê-los.
Ora, depois de terem descoberto este “rosto” de Deus, os discípulos têm alguma razão para ter medo? A certeza de ser filho de Deus é, sem dúvida, algo que alimenta a capacidade do discípulo em empenhar-se – sem medo, sem prevenções, sem preconceitos, sem condições – na missão. Nada – nem as dificuldades, nem as perseguições – conseguem calar esse discípulo que confia na solicitude, no cuidado e no amor de Deus Pai.
As últimas palavras (vers. 32-33) da leitura que hoje nos é proposta contêm uma séria advertência de Jesus: a atitude do discípulo diante da perseguição condicionará o seu destino último… Aqueles que se mantiveram fiéis a Deus e aos seus projectos e que testemunharam com desassombro a Palavra encontrarão vida definitiva; mas aqueles que procuraram proteger-se, comodamente instalados numa vida morna, sem riscos, sem chatices, e também sem coerência, terão recusado a vida em plenitude: esses não poderão fazer parte da comunidade de Jesus.


* 2ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: Génesis 12, 1-9

Naqueles dias, o Senhor disse a Abrão: «Deixa a tua terra, a tua família e a casa do teu pai, e vai para a terra que Eu te indicar. 2Farei de ti um grande povo, abençoar-te-ei, engrandecerei o teu nome e serás uma fonte de bênçãos. 3Abençoarei aqueles que te abençoarem, e amaldiçoarei aqueles que te amaldiçoarem. E todas as famílias da Terra serão em ti abençoadas.» 4Abrão partiu, como o Senhor lhe dissera, levando consigo Lot. Quando saiu de Haran, Abrão tinha setenta e cinco anos. 5Tomou Sarai, sua mulher, e Lot, filho do seu irmão, assim como todos os bens que possuíam e os escravos que tinham adquirido em Haran, e partiram todos para a terra de Canaã, e chegaram à terra de Canaã. 6Abrão percorreu-a até ao lugar de Siquém, até aos carvalhos de Moré. Os cananeus viviam, então, naquela terra. 7O Senhor apareceu a Abrão e disse-lhe: «Darei esta terra à tua descendência.» E Abrão construiu ali um altar ao Senhor, que lhe tinha aparecido. 8Deixando esta região, prosseguiu até ao monte situado ao oriente de Betel, e montou ali as suas tendas, ficando Betel ao ocidente e Ai ao oriente. Construiu também um altar ao Senhor e invocou o seu nome. 9Abrão continuou a sua viagem, acampando aqui e ali, em direcção ao Négueb.

Evangelho: Mateus 7, 1-5

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 1«Não julgueis, para não serdes julgados; 2pois, conforme o juízo com que julgardes, assim sereis julgados; e, com a medida com que medirdes, assim sereis medidos. 3Porque reparas no argueiro que está na vista do teu irmão, e não vês a trave que está na tua vista? 4Como ousas dizer ao teu irmão: ‘Deixa-me tirar o argueiro da tua vista’, tendo tu uma trave na tua? 5Hipócrita, tira primeiro a trave da tua vista e, então, verás melhor para tirar o argueiro da vista do teu irmão.»

Reflexão

Começamos, hoje, a ouvir a história de Abraão, modelo da caminhada de fé dos crentes. O amor de Deus por este homem revela-se, no mínimo, desconcertante: «Deixa a tua terra, a tua família e a casa do teu pai, e vai» (v. 1). Para onde? «Para a terra que Eu te indicar» (v. 1). Tudo é obscuro para o Patriarca. Apenas brilha a luz de uma promessa de Deus: «Farei de ti um grande povo, abençoar-te-ei, engrandecerei o teu nome e serás uma fonte de bênçãos» (v.2). Confiado na palavra do Senhor, Abraão partiu. Obedeceu na fé: «Abrão partiu, como o Senhor lhe dissera» (v. 4). Abraão chega com a família à terra de Canaã. Percorre-a, e conhece os seus habitantes. Talvez não lhe parecesse fácil tomar posse daquela terra. Mas Deus volta a falar-lhe: «Darei esta terra à tua descendência» (v. 7). O Patriarca vê delinear-se o projecto de Deus. É preciso que ele morra, para que as gerações futuras tenham vida. Então, «construiu ali um altar ao Senhor, que lhe tinha aparecido» (v. 7). E continuou a sua peregrinação: «Deixando esta região, prosseguiu até ao monte situado ao oriente de Betel, e montou ali as suas tendas…
Construiu também um altar ao Senhor e invocou o seu nome… Continuou a sua viagem, acampando aqui e ali, em direcção ao Négueb». Basta-lhe estar em relação com Deus e cumprir a sua vontade.
É assim que Deus educa Abraão, e cada um dos crentes, a sucessivos desapegos, que podem parecer exagerados, mas que conduzem à liberdade. Não há volta a dar: ou aceitamos o projecto de Deus que nos quer tornar dom para a sua glória e para o bem dos outros, ou nos fechamos no nosso egoísmo mesquinho que nos faz prisioneiros de nós mesmos. Abraão aceitou tornar-se dom incondicional, sem nada saber o que estava para acontecer. A fé é isto: é estar abertos, disponíveis, aceitar caminhar nas trevas ao encontro de Alguém em quem confiamos, felizes por Lhe podermos dar o que nos pede, por O amarmos por Si mesmo, por pormos n´Ele a nossa alegria e o nosso amor, numa relação pessoal que Deus quer tornar cada vez melhor e mais bela. Tudo o resto é secundário. Deus repete-nos a sua palavra muitas vezes na vida, porque a nossa liberdade precisa de ser muitas vezes libertada.
No evangelho, Jesus recomenda que não julguemos os outros. Ele também não julgou, mas entregou-Se para a todos salvar e justificar. Deu a vida para que todos tenhamos a vida. O seu juízo sobre o mundo é a cruz, um amor sem limites e misericordioso para com todos, sem qualquer excepção. Cada homem tem, para Jesus, o valor do amor que o Pai tem por Ele, seu Filho. Mas Deus amou tanto o mundo que entregou esse Filho para o salvar. Cada vez que não julgamos os outros, damos um grande passo rumo àquela terra prometida para onde nos levam as mais humildes manifestações de delicadeza, de amor e de respeito para com os irmãos. Não julgar, amar os irmãos, é partir de nós mesmos ao encontro do Senhor que, durante a peregrinação terrena apenas podemos ver nos ícones que são os nossos irmãos, particularmente o mais fracos e carenciados.
A vida comunitária exige que cada um acolha os outros como realmente são, com a sua personalidade e funções, com as suas iniciativas e limitações... (Cst 66). Há que não julgar ninguém. Julgar é presumir que se conhecem as intenções profundas do coração. Mas só Deus as conhece. Ainda que não aprovemos, respeitamos a liberdade pessoal de cada um, as suas opiniões e convicções diferentes. «A vida comunitária exige que cada um acolha os outros como realmente são». É um acto de amor, que desejamos também para nós, tendo presente o ensinamento do Concílio Vaticano II: «Seja reconhecida aos fiéis, tanto eclesiásticos como leigos, a liberdade de investigar, de pensar, de manifestar com humildade e com coragem a sua opinião no campo em que são competentes» (GS 62).


* 3ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: Génesis 13, 2.5-18

Abrão era muito rico em rebanhos, prata e ouro. 5Lot, que acompanhava Abrão, possuía, igualmente, ovelhas, bois e tendas; 6a terra não era bastante grande para nela se estabelecerem os dois, porque os bens de ambos eram avultados. 7Houve questões entre os pastores dos rebanhos de Abrão e os pastores dos rebanhos de Lot. Os cananeus e os perizeus habitavam, então, aquela terra. 8Abrão disse a Lot: «Peço-te que entre nós e entre os nossos pastores não haja conflitos, pois somos irmãos. 9Aí tens essa região toda diante de ti. Separemo-nos. Se fores para a esquerda, irei para a direita; se fores para a direita, irei para a esquerda.» 10Lot ergueu os olhos e viu todo o vale do Jordão, que era inteiramente regado. Antes de o Senhor ter destruído Sodoma e Gomorra, estendendo-se até Soar, o vale era um maravilhoso jardim, como a terra do Egipto. 11Lot escolheu para si todo o vale do Jordão e dirigiu-se para o oriente, separando-se um do outro. 12Abrão fixou-se na terra de Canaã, e Lot nas cidades do vale, no qual ergueu as suas tendas até Sodoma. 13Ora, os habitantes de Sodoma eram perversos, e grandes pecadores diante do Senhor. 14Depois de Lot o ter deixado, Deus disse a Abrão: «Ergue os teus olhos e, do sítio em que estás, contempla o norte, o sul, o oriente e o ocidente. 15Toda a terra que estás a ver, dar-ta-ei, a ti e aos teus descendentes, para sempre. 16Farei que a tua descendência seja numerosa como o pó da terra, de modo que só se alguém puder contar o pó da terra é que a tua posteridade poderá ser contada. 17Levanta-te, percorre esta terra em todas as direcções, porque Eu ta darei.» 18Abrão desmontou as suas tendas e foi residir junto aos carvalhos de Mambré, próximo de Hebron; e ali construiu um altar ao Senhor.

Evangelho: Mateus 7, 6.12-14

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 6«Não deis as coisas santas aos cães nem lanceis as vossas pérolas aos porcos, para não acontecer que as pisem aos pés e, acometendo-vos, vos despedacem.» 12«Portanto, o que quiserdes que vos façam os homens, fazei-o também a eles, porque isto é a Lei e os Profetas.» 13«Entrai pela porta estreita; porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que seguem por ele. 14Como é estreita a porta e quão apertado é o caminho que conduz à vida, e como são poucos os que o encontram!».»

Reflexão

O desapego, a que a fé leva o crente, dá-lhe uma grande liberdade de espírito. Os ricos, muitas vezes, andam preocupados em conservar e aumentar as suas riquezas. Abraão, pelo contrário, está mais preocupado em ter boas relações com os seus vizinhos, do que em ter abundância de pastos, de água e de rebanhos. Quer evitar conflitos com o seu sobrinho Lot e, com grande liberdade de espírito, antecipa a regra de ouro proclamada por Jesus: «o que quiserdes que vos façam os homens, fazei-o também a eles» (v. 12). Abraão diz ao sobrinho: «Peço-te que entre nós e entre os nossos pastores não haja conflitos, pois somos irmãos. Aí tens essa região toda diante de ti. Separemo-nos. Se fores para a esquerda, irei para a direita; se fores para a direita, irei para a esquerda» (vv. 8-9). Deixar ao outro escolher é o melhor modo de evitar conflitos. Mas não é uma decisão fácil, porque vemos melhor os nossos direitos, e os deveres dos outros, do que os seus interesses. Lot escolhe o fértil vale do Jordão, enquanto Abraão se contenta com a parte montanhosa e árida de Canaã. Podemos ver neste episódio uma aplicação ante litteram do ensinamento de Jesus: «Entrai pela porta estreita; porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que seguem por ele. Como é estreita a porta e quão apertado é o caminho que conduz à vida» (vv. 13-14). Jesus é, como sabemos, o caminho, o caminho estreito, que passa pela Cruz, mas que chega à Vida, à vida divina que é Ele mesmo. Jesus é também a porta estreita do desapego, do abandono, da abnegação, que nos dá acesso à Felicidade, à Bem-aventurança, que, ao fim e ao cabo, é Ele mesmo, com o Pai e o Espírito Santo. Lot escolheu o «caminho espaçoso», o caminho fácil, que, no seu termo, conduzia a Sodoma e a Gomorra, símbolos da corrupção e da perdição. Abraão optou pelo «caminho estreito», que levava a Canaã, a Terra Prometida: «Ergue os teus olhos e, do sítio em que estás, contempla o norte, o sul, o oriente e o ocidente. Toda a terra que estás a ver, dar-ta-ei, a ti e aos teus descendentes, para sempre» (vv. 14-15).
Esta página leva-nos, mais uma vez, a meditar sobre a nossa situação neste mundo. Há sempre dois caminhos diante de nós: o que leva à vida e o que leva à morte. Há que optar por um deles. Em termos actuais, diríamos que temos de escolher entre o que nos agrada, o que nos satisfaz imediatamente, sem nos interessarmos pelos outros, e o que é justo e recto, o que é conforme à vontade de Deus e ao bem dos irmãos. Esta segunda opção pode parecer-nos dura e exigente no começo. Mas alarga-nos o coração e os horizontes. Leva à felicidade.
Assim, vemos antecipadamente realizadas em Abraão as palavras de Jesus: «A felicidade está mais em dar do que em receber» (Act 20, 35).
A nossa vida de oblação exige a opção pelo caminho apertado e pela porta estreita, em união com Cristo, vivendo a oblação de Cristo. Mas, essa opção, antes de ser fruto do nosso esforço, da nossa generosidade e boa vontade, é fruto do amor de Deus, da graça, da oração: é dom do Coração de Cristo, é sustentada pela Espírito.


* 4ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: Génesis 15, 1-12.17-18

Naqueles dias, 1após estes acontecimentos, o Senhor disse a Abrão numa visão: «Nada temas, Abrão! Eu sou o teu escudo, a tua recompensa será muito grande.» 2Abrão respondeu: «Que me dareis, Senhor Deus? Vou-me sem filhos e o herdeiro da minha casa é Eliézer, de Damasco.» 3Acrescentou: «Não me concedeste descendência, e é um escravo, nascido na minha casa, que será o meu herdeiro.» 4Então a palavra do Senhor foi-lhe dirigida, nos seguintes termos: «Não é ele que será o teu herdeiro, mas aquele que sairá das tuas entranhas.» 5E, conduzindo-o para fora, disse-lhe: «Levanta os olhos para o céu e conta as estrelas, se fores capaz de as contar.» E acrescentou: «Pois bem, será assim a tua descendência.» 6Abrão confiou no Senhor, e Ele considerou-lhe isso como mérito. 7O Senhor disse-lhe depois: «Eu sou o Senhor que te mandou sair de Ur, na Caldeia, para te dar esta terra.» 8Perguntou-lhe Abrão: «Senhor Deus, como saberei que tomarei posse dela?» 9Disse-lhe o Senhor: «Toma uma novilha de três anos, uma cabra de três anos, um carneiro de três anos, uma rola e um pombo ainda novo.» 10Abrão foi procurar todos estes animais, cortou-os ao meio e dispôs cada metade em frente uma da outra; não cortou, porém, as aves. 11As aves de rapina desciam sobre as carnes mortas, mas Abrão afugentava-as. 12Ao pôr do sol, apoderou-se dele um sono profundo; ao mesmo tempo, sentiu-se apavorado e foi envolvido por densa treva. 17Quando o Sol desapareceu, e sendo completa a escuridão, surgiu um braseiro fumegante e uma chama ardente, que passou entre as metades dos animais. 18Naquele dia, o Senhor concluiu uma aliança com Abrão, dizendo-lhe: «Dou esta terra à tua descendência, desde o rio do Egipto até ao grande rio, o Eufrates.

Evangelho: Mateus 7, 15-20

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 5«Acautelai-vos dos falsos profetas, que se vos apresentam disfarçados de ovelhas, mas por dentro são lobos vorazes. 16Pelos seus frutos, os conhecereis. Porventura podem colher-se uvas dos espinheiros ou figos dos abrolhos? 17Toda a árvore boa dá bons frutos e toda a árvore má dá maus frutos. 18A árvore boa não pode dar maus frutos nem a árvore má, dar bons frutos. 19Toda a árvore que não dá bons frutos é cortada e lançada ao fogo. 20Pelos frutos, pois, os conhecereis.

Reflexão

A página do Génesis, que escutamos, é profunda e suscitou cuidada reflexão de Paulo. Abraão é apresentado como exemplo de fé: «Abraão acreditou em Deus e isso foi-lhe atribuído à conta de justiça», escreve o Apóstolo (Gl 3, 6; Rm 4, 3). No nosso texto, em que já podemos entrever o mistério de Cristo e da vida cristã, também descobrimos a esperança de Abraão, e a sua adesão ao mistério da caridade de Deus. O Patriarca escuta a palavra do Senhor: «Nada temas, Abrão! Eu sou o teu escudo, a tua recompensa será muito grande» (v. 1). Com esta palavra, Deus reaviva a fé de Abraão, que tem de ultrapassar as circunstâncias imediatas, que não parecem oferecer perspectivas de futuro: «Vou-me sem filhos e o herdeiro da minha casa é Eliézer, de Damasco» (v. 2). Mas o Senhor insiste: «Não é ele que será o teu herdeiro, mas aquele que sairá das tuas entranhas» (v. 4). Imediatamente Deus faz sair Abraão da sua tenda para contemplar o céu estrelado: «Levanta os olhos para o céu e conta as estrelas, se fores capaz de as contar.» E acrescentou: «Pois bem, será assim a tua descendência.» (v. 5).
Abraão acreditou e a sua fé tornou-o justo. As palavras de Deus, que em sentido imediato se referem a Isaac, em última análise preanunciam Cristo, o herdeiro de Abraão por excelência, e a multidão de filhos de Abraão, que hão-de ser todos os que vierem a acreditar em Cristo. É o que diz Paulo na Carta aos Gálatas: «Os que dependem da fé é que são filhos de Abraão» (Gl 3, 7). Abraão acreditou em Deus. Nós havemos de escutar a palavra de Cristo para acreditarmos e encontrarmos a plenitude da vida. O texto do Génesis, que hoje escutamos, não só evoca a palavra do Senhor, mas também a sua acção, que conclui a aliança. O sacrifício misterioso, acompanhado simultaneamente por uma manifestação de terror e de esperança, é sinal profético do sacrifício de Cristo, que estabelecerá a nova e eterna Aliança. Assim Abraão é já misteriosamente introduzido no mistério de Cristo, e sê-lo-á ainda mais profundamente no momento do sacrifício de Isaac. Abraão escuta a Deus e, pela sua obediência, vê o dia de Cristo e enche-se de alegria, como dirá Jesus no evangelho de João.
O exemplo de Abraão guia-nos na direcção certa, a da fé na palavra do Senhor e no fruto do Espírito, que transforma a vida em modo consequente à fé.
A primeira e mais importante aliança, para nós, é a do Baptismo, que nos torna filhos de Deus e prontos a renunciar ao demónio e às suas seduções. O bom fruto que Deus espera de nós, e que testemunhemos a boa qualidade da árvore que somos, é a fidelidade constante aos nossos compromissos baptismais: «Com todos os nossos irmãos cristãos confessamos... que Cristo é o Senhor, no qual o Pai nos manifestou o seu amor e que continua presente no mundo para o salvar» (Cst 9). Esta confissão de fé em Jesus Cristo Senhor só é possível se permanecermos unidos a Ele e recebermos d´Ele a seiva divina, que é o seu Espírito.


* 5ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: Génesis 16, 1-12.15-16

1Sarai, mulher de Abrão, que não lhe dera filhos, tinha uma escrava egípcia, chamada Agar. 2Sarai disse a Abrão: «Visto que o Senhor me tornou uma estéril, peço-te que vás ter com a minha escrava. Talvez, por ela, eu consiga ter filhos.» Abrão aceitou a proposta de Sarai. 3Então, Sarai, mulher de Abrão, tomou Agar, sua escrava egípcia, e deu-a por mulher a Abrão, seu marido, depois de Abrão ter vivido dez anos na terra de Canaã. 4Ele abeirou-se de Agar, e ela concebeu. E, reconhecendo-se grávida, começou a olhar desdenhosamente para a sua senhora. 5Sarai disse a Abrão: «Recaia sobre ti a vergonha que sofro por tua causa. Fui eu que entreguei a minha escrava nos teus braços e, agora que sabe ter concebido, despreza-me. Que o Senhor julgue aos dois, a ti e a mim!» 6Abrão respondeu-lhe: «A tua escrava está sob o teu domínio; faz dela o que te aprouver.» Então, Sarai tratou-a mal e humilhou-a, e Agar fugiu da sua presença. 7O mensageiro do Senhor encontrou-a junto de uma fonte no deserto, a caminho de Chur. 8Ele disse-lhe: «Agar, escrava de Sarai, de onde vens tu? E para onde vais?» Ela respondeu-lhe: «Fujo de Sarai, a minha senhora.» 9O mensageiro do Senhor disse-lhe: «Volta para a casa dela e humilha-te diante da tua senhora.» 10O mensageiro do Senhor acrescentou: «Multiplicarei a tua descendência, e será tão numerosa que ninguém a poderá contar.» 11O mensageiro do Senhor disse-lhe ainda: «Estás grávida e vais ter um filho, e dar-lhe-ás o nome de Ismael, porque o Senhor escutou a voz da tua angústia. 12Ele será como um cavalo selvagem entre os homens; a sua mão erguer-se-á contra todos, a mão de todos erguer-se-á contra ele, e colocará a sua tenda em frente de todos os seus irmãos.» 15Agar teve um filho de Abrão; este pôs o nome de Ismael ao seu filho dado à luz por Agar. 16Abrão tinha oitenta e seis anos quando Agar lhe deu Ismael.

Evangelho: Mateus 7, 21-29

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 21«Nem todo o que me diz: ‘Senhor, Senhor’ entrará no Reino do Céu, mas sim aquele que faz a vontade de meu Pai que está no Céu. 22Muitos me dirão naquele dia: ‘Senhor, Senhor, não foi em teu nome que profetizámos, em teu nome que expulsámos os demónios e em teu nome que fizemos muitos milagres?’ 23E, então, dir-lhes-ei: ‘Nunca vos conheci; afastai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade.’» 24«Todo aquele que escuta estas minhas palavras e as põe em prática é como o homem prudente que edificou a sua casa sobre a rocha. 25Caiu a chuva, engrossaram os rios, sopraram os ventos contra aquela casa; mas não caiu, porque estava fundada sobre a rocha. 26Porém, todo aquele que escuta estas minhas palavras e não as põe em prática poderá comparar-se ao insensato que edificou a sua casa sobre a areia. 27Caiu a chuva, engrossaram os rios, sopraram os ventos contra aquela casa; ela desmoronou-se, e grande foi a sua ruína.» 28Quando Jesus acabou de falar, a multidão ficou vivamente impressionada com os seus ensinamentos, 29porque Ele ensinava-os como quem possui autoridade e não como os doutores da Lei.

Reflexão

Acreditar em Deus, confiar pacientemente na realização das suas promessas, como e quando quiser, e cumprir a sua vontade, são atitudes básicas exigidas pelo Senhor ao verdadeiro crente. Jesus, no evangelho de hoje, revela idênticas exigências: «Nem todo o que me diz: ‘Senhor, Senhor’ entrará no Reino do Céu, mas sim aquele que faz a vontade de meu Pai que está no Céu» (v. 21). Todo o Sermão da Montanha é um forte convite ao cumprimento da vontade de Deus, com pureza, generosidade e perfeição. Mas nada disto é possível à nossa fragilidade humana. Por isso, o próprio Jesus nos dá o meio e a força necessários. O meio é a sua palavra: «Todo aquele que escuta estas minhas palavras e as põe em prática é como o homem prudente» (v. 24). A palavra de Jesus faz-nos conhecer a vontade do Pai. Se escutarmos as palavras de Jesus, estaremos mergulhados na vontade do Pai e, «nesse dia»,
Ele irá reconhecer-nos como benditos do seu Pai. A força também nos é oferecida por Jesus, que nos dá um coração novo, o seu próprio coração, o seu coração obediente para realizarmos a vontade do Pai, ainda sobre nós se abatam a chuva, o vento, as ondas das provações e das adversidades, porque estaremos fundados na rocha. Com Deus em nós, temos a sua força, a sua alegria, já estamos no paraíso.
Não devemos, pois, querer forçar os tempos, nem perder-nos em belas palavras que nos iludam ou possam iludir os outros. Jesus crucificado põe-se silenciosamente diante de nós para nos lembrar que não podemos fazer batota. Não podemos sequer recorrer a astúcias ou procurar atalhos. O projecto é dele, o tempo é dele, as modalidades são dele. Compete-nos apenas reconhecer com humildade a sua santidade e o seu amor com que «nos escolheu em Cristo, antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis na sua presença, no amor» (Ef 1, 4).
Como amigos de Deus conhecemos a lei da amizade: os amigos têm o mesmo querer e o mesmo não querer. Aceitar amorosamente a vontade de Deus na nossa vida, através das mediações que põe no nosso caminho, é cultivar a amizade com Deus, é praticar a obediência como virtude do abandono de amor filial nos Seus braços. Tal como a castidade e a pobreza, a obediência dehoniana «estimula-nos a viver na confiança e na gratuidade do amor» (Cst 46; cf.nn. 24.68), num «um amor sem reservas» (Cst 41). Na obediência, realizamos o nosso carisma que nos leva a viver «como o único necessário, uma vida de união à oblação de Cristo» (Cst 26). Em cada acto de obediência, vivemos aquele «Ecce venio» (Heb 10, 7) que «define a atitude fundamental da nossa vida. Faz da nossa obediência um acto de oblação; configura a nossa existência com a de Cristo, pela redenção do mundo e para Glória do Pai» (Cst 58).


* 6ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: Génesis 17, 1.9-10.15-22

1Abrão tinha noventa e nove anos, quando o Senhor lhe apareceu e lhe disse: «Eu sou o Deus supremo. Anda na minha presença e sê perfeito. 9Deus disse a Abraão: «Da tua parte, cumprirás a minha aliança, tu e a tua descendência, nas futuras gerações. 10Eis a aliança estabelecida entre mim e vós, que tereis de respeitar: todo o homem, entre vós, será circuncidado. 15Deus disse a Abraão: «Não chamarás mais à tua mulher, Sarai, mas o seu nome será Sara. 16Abençoá-la-ei e dar-te-ei um filho, por meio dela. Será por mim abençoada, e será mãe de nações, e dela sairão reis.» 17Abraão prostrou-se com o rosto por terra, e sorriu, dizendo para consigo: «Pode uma criança nascer de um homem de cem anos? E Sara, mulher de noventa anos, vai agora ter filhos?» 18Depois, disse a Deus: «Possa Ismael viver diante de ti!» 19Mas Deus respondeu-lhe: «Não! Sara, tua mulher, dar-te-á um filho, a quem hás-de chamar Isaac. Farei a minha aliança com ele, aliança que será perpétua para a sua descendência depois dele. 20Quanto a Ismael, também te escutei. Abençoá-lo-ei, torná-lo-ei fecundo e multiplicarei extremamente a sua descendência. Será pai de doze príncipes, e farei sair dele um grande povo. 21Porém, é com Isaac que Eu estabelecerei a minha aliança, Isaac que Sara te há-de dar, por esta mesma época do próximo ano.» 22E, tendo acabado de falar com ele, Deus desapareceu de junto de Abraão.

Evangelho: Mateus 8, 1-4

1Ao descer do monte, seguia-o uma enorme multidão. 2Foi, então, abordado por um leproso que se prostrou diante dele, dizendo-lhe: «Senhor, se quiseres, podes purificar-me.» 3Jesus estendeu a mão e tocou-o, dizendo: «Quero, fica purificado!» No mesmo instante, ficou purificado da lepra. 4Jesus, porém, disse-lhe: «Vê, não o digas a ninguém; mas vai mostrar-te ao sacerdote e apresenta a oferta que Moisés preceituou, para que lhes sirva de testemunho.

Reflexão

«Toda a Sagrada Escritura nos fala do Coração de Jesus», escreveu o Pe. Dehon. Mas, já antes dele, Santo Agostinho dizia que toda a Escritura está cheia de Cristo. A Constituição Conciliar Dei Verbum garante: «Deus dispôs sabiamente que o Novo Testamento estivesse escondido no Antigo e que o Antigo se tornasse claro no novo… Os livros do Antigo Testamento, integralmente assumidos na pregação evangélica, adquirem e manifestam o seu significado pleno no Novo, que iluminam e explicam». Sendo assim, a primeira leitura de hoje fala da ressurreição do Senhor. Paulo, na Carta aos Romanos, explica que Abraão, ao acreditar no anúncio do nascimento de Isaac, acreditou sem saber na ressurreição de Cristo, porque, tanto ele como Sara, eram velhos, «quase mortos». Acreditou firmemente que Deus, de dois seres tão avançados na idade, podia suscitar um filho, Isaac, que é promessa e profecia da ressurreição.
Também o milagre referido no evangelho é anúncio da ressurreição de Cristo: «Jesus estendeu a mão e tocou-o, dizendo: «Quero, fica purificado!» (v. 3). O «toque» de Jesus no leproso, considerado pecador, impuro, capaz de tornar impuro quem com ele contactasse, ainda que inadvertidamente, é símbolo da paixão de Cristo. Jesus, ao fazer-se homem, tocou a nossa lepra. Apresentou-se à paixão como um «leproso», como pecador; em troca, pela sua morte e ressurreição, fonte de vida, curou-nos, purificou-nos ontológica e radicalmente. De facto, Ele é o santo de Deus, que assumiu o nosso pecado e que, apenas pela sua força, realizou em nosso favor o que nos era impossível realizar.
Se Jesus não interviesse em nosso favor, com a sua vontade de bem e de salvação, para nos tornar santos, participantes da sua filial pureza e beleza, ser-nos-ia absolutamente impossível caminhar em integridade diante de Deus. Mas foi para isso que Ele veio ao mundo e morreu por nós. Resta-nos querer ser realmente purificados. Só na liberdade podemos ser curados dos nossos males, escolher o que é bom e fazer o bem. Só na liberdade, podemos acolher os dons do Espírito, viver as bem-aventuranças, irradiar os frutos e os carismas do mesmo Espírito.


* SÁBADO - Anos Ímpares

Primeira leitura: Génesis 18, 1-15

Naqueles dias, o Senhor apareceu a Abraão junto dos carvalhos de Mambré, quando ele estava sentado à porta da sua tenda, durante as horas quentes do dia. 2Abraão ergueu os olhos e viu três homens de pé em frente dele. Imediatamente correu da entrada da tenda ao seu encontro, prostrou-se por terra 3e disse: «Meu Senhor, se mereci o teu favor, peço-te que não passes adiante, sem parar em casa do teu servo. 4Permite que se traga um pouco de água para vos lavar os pés; e descansai debaixo desta árvore. 5Vou buscar um bocado de pão e, quando as vossas forças estiverem restauradas, prosseguireis o vosso caminho, pois não deve ser em vão que passastes junto do vosso servo.» Eles responderam: «Faz como disseste.» 6Abraão foi, sem perda de tempo, à tenda onde se encontrava Sara e disse-lhe: «Depressa, amassa já três medidas de flor de farinha e coze uns pães no borralho.» 7Correu ao rebanho, escolheu um vitelo dos mais tenros e gordos e entregou-o ao servo, que imediatamente o preparou. 8Tomou manteiga, leite e o vitelo já pronto e colocou-o diante deles. E ficou de pé junto dos estranhos, debaixo da árvore, enquanto eles comiam. 9Então, disseram-lhe: «Onde está Sara, tua mulher?» Ele respondeu: «Está aqui na tenda.» 10Um deles disse: «Passarei novamente pela tua casa dentro de um ano, nesta mesma época; e Sara, tua mulher, terá já um filho.» Ora, Sara estava a escutar à entrada da tenda, mesmo por trás dele. 11Abraão e Sara eram já velhos, de idade muito avançada, e Sara já não estava em idade de ter filhos. 12Sara riu-se consigo mesma e pensou: «Velha como estou, poderei ainda ter esta alegria, sendo também velho o meu senhor?» 13O Senhor disse a Abraão: «Porque está Sara a rir e a dizer: ‘Será verdade que eu hei-de ter um filho, velha como estou?’ 14Haverá alguma coisa que seja impossível para o Senhor? Dentro de um ano, nesta mesma época, voltarei à tua casa, e Sara terá já um filho.» 15Cheia de medo, Sara negou, dizendo: «Não me ri.» Mas Ele disse-lhe: «Não! Tu riste-te mesmo.»

Evangelho: Mateus 8, 5-17

Naquele tempo, 5entrando Jesus em Cafarnaúm, aproximou-se dele um centurião, suplicando nestes termos: 6«Senhor, o meu servo jaz em casa paralítico, sofrendo horrivelmente.» 7Disse-lhe Jesus: «Eu irei curá-lo.» 8Respondeu-lhe o centurião:«Senhor, eu não sou digno de que entres debaixo do meu tecto; mas diz uma só palavra e o meu servo será curado. 9Porque eu, que não passo de um subordinado, tenho soldados às minhas ordens e digo a um: ‘Vai’, e ele vai; a outro: ‘Vem’, e ele vem; e ao meu servo: ‘Faz isto’, e ele faz.» 10Jesus, ao ouvi-lo, admirou-se e disse aos que o seguiam: «Em verdade vos digo: Não encontrei ninguém em Israel com tão grande fé! 11Digo-vos que, do Oriente e do Ocidente, muitos virão sentar-se à mesa do banquete com Abraão, Isaac e Jacob, no Reino do Céu, 12ao passo que os filhos do Reino serão lançados nas trevas exteriores, onde haverá choro e ranger de dentes.» 13Disse, então, Jesus ao centurião: «Vai, que tudo se faça conforme a tua fé.» Naquela mesma hora, o servo ficou curado. 14Entrando em casa de Pedro, Jesus viu que a sogra dele jazia no leito com febre. 15Tocou-lhe na mão, e a febre deixou-a. E ela, levantando-se, pôs-se a servi-lo. 16Ao entardecer, apresentaram-lhe muitos possessos; e Ele, com a sua palavra, expulsou os espíritos e curou todos os que estavam doentes, 17para que se cumprisse o que foi dito pelo profeta Isaías: Ele tomou as nossas enfermidades e carregou as nossas dores.

Reflexão

A primeira leitura mostra-nos como Deus tem em conta a hospitalidade. Abraão dá-nos uma boa lição da disponibilidade e generosidade com que deve ser praticada. «Durante as horas quentes do dia», repousava tranquilo à porta da tenda. Mas não se importou de ser incomodado pelos três misteriosos hóspedes que se aproximam: «Imediatamente correu da entrada da tenda ao seu encontro, prostrou-se por terra» (v. 2), pedindo-lhes que se detivessem em sua casa e comessem «um bocado de pão» (v. 5). Mais tarde, será o próprio Deus a oferecer aos homens o Pão descido do céu. Depois de lhes ter lavado os pés, tal como Jesus fará um dia aos Apóstolos, Abraão ordena a Sara, sua esposa, que prepare uma generosa refeição com o vitelo que, ele mesmo, vai buscar à manada. Assim fará o pai misericordioso ao ver regressar o filho pródigo. Abraão convida os seus hóspedes a repousar à sombra da árvore. Deus far-nos-á repousar à sombra da Cruz. A hospitalidade do Patriarca é solícita, modesta e generosa. A narrativa acaba por nos dizer que Abraão hospeda e alimenta o próprio Deus, que, antes de partir, lhe recompensa a generosidade com a promessa de um filho. Sara ri-se de tal promessa: tanto ela como o marido eram de avançada idade. Mas, um ano depois, ouvir-se o riso estridente do pequeno Isaac, filho do riso. Isaac, por sua vez, é figura de Jesus, nascido da Virgem Maria. Sobre Ele pesarão os pecados da humanidade. Maltratado, sofrerá sozinho o escárnio. Morto e ressuscitado, a todos salva: «Haverá alguma coisa que seja impossível para o Senhor» (v. 14).
O autor da Carta aos Hebreus exorta os cristãos a não esquecerem a hospitalidade: «pois, graças a ela, alguns, sem o saberem, hospedaram anjos» (13, 2). São Bento, com grande concisão, escreve na sua Regra: «Vem um hóspede, vem Cristo». Acolher os outros dá-nos a certeza de receber ao próprio Cristo: «Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes» (Mt 25, 40). O melhor modo de acolher a Cristo é acolhê-lo como Ele quer ser acolhido. Marta afadigou-se para receber bem a Jesus. Mas a sua irmã, Maria, acolheu-O como Ele queria ser acolhido: «Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada», diz Jesus (Lc 10, 42). Mas há um modo ainda mais profundo de acolher a Cristo, que consiste em acolher na nossa própria carne os seus sofrimentos, em favor da Igreja, para completar a sua obra redentora: «alegro-me nos sofrimentos que suporto por vós e completo na minha carne o que falta às tribulações de Cristo, pelo seu Corpo, que é a Igreja», escreve Paulo (Cl 1, 24). Não se trata, de evidentemente, de completar os sofrimentos expiatórios de Cristo, que já estão completos. Mas o Apóstolo vive as suas tribulações apostólicas, como Cristo, por primeiro, as experimentou. Em Cristo, Paulo, e todo o que quer ser apóstolo, particularmente o que é chamado a ser Oblato-Sacerdote do Coração de Jesus, tem o seu lugar na cruz, ao lado do seu Senhor e Salvador, em favor do Corpo místico de Cristo.

Ricardo Igreja

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