sexta-feira, 25 de março de 2011

X DOMINGO TEMPO COMUM

* DOMINGO
 
 
«Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores»


LEITURA I – Os 6,3-6

Procuremos conhecer o Senhor. A sua vinda é certa como a aurora. Virá a nós como o aguaceiro de Outono, como a chuva da Primavera sobre a face da terra. «Que farei por ti, Efraim? Que farei por ti, Judá?» – diz o Senhor – «O vosso amor é como o nevoeiro da manhã, como o orvalho da madrugada, que logo se evapora. Por isso vos castiguei por meio dos Profetas e vos matei com palavras da minha boca; e o meu direito resplandece como a luz. Porque Eu quero a misericórdia e não o sacrifício, o conhecimento de Deus, mais que os holocaustos».

LEITURA II – Rom 4,18-25

Irmãos: Contra toda a esperança, Abraão acreditou que havia de tornar-se pai de muitas nações, como tinha sido anunciado: «Assim será a tua descendência». Sem vacilar na fé, não tomou em consideração nem a falta de vigor do seu corpo, pois tinha quase cem anos, nem a falta de vitalidade do seio materno de Sara. Perante a promessa de Deus, não se deixou abalar pela desconfiança, antes se fortaleceu na fé, dando glória a Deus, plenamente convencido de que Deus era capaz de cumprir o que tinha prometido. Por este motivo é que isto «lhe foi atribuído como justiça». Não é só por causa dele que está escrito «Foi-lhe atribuído», mas também por causa de nós, que acreditamos n’Aquele que ressuscitou dos mortos, Jesus, Nosso Senhor, que foi entregue à morte por causa das nossas faltas e ressuscitou para nossa justificação.

EVANGELHO – Mt 9,9-13

Naquele tempo, Jesus ia a passar, quando viu um homem chamado Mateus, sentado no posto de cobrança dos impostos, e disse-lhe: «Segue-Me». Ele levantou-se e seguiu Jesus. Um dia em que Jesus estava à mesa em casa de Mateus, muitos publicanos e pecadores vieram sentar-se com Ele e os seus discípulos. Vendo isto, os fariseus diziam aos discípulos: «Por que motivo é que o vosso Mestre come com os publicanos e os pecadores?». Jesus ouviu-os e respondeu: «Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes. Ide aprender o que significa: ‘Prefiro a misericórdia ao sacrifício’. Porque Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores».

Reflexão

O relato da vocação de Mateus (vers. 9) não é substancialmente distinto do relato do chamamento de outros discípulos (cf. Mt 4,18-22): em qualquer dos casos fala-se de homens que estão a trabalhar, a quem Jesus chama e que, deixando tudo, seguem Jesus. Os “chamados” não são “super-homens”, seres perfeitos e santos, estranhos ao mundo, pairando acima das nuvens, sem contacto com a vida e com os problemas e dramas dos outros homens e mulheres; mas são pessoas normais, que vivem uma vida normal, que trabalham, lutam, riem e choram… No entanto, todos são chamados ao seguimento de Jesus. O verbo “akolouthéô”, aqui utilizado na forma imperativa, traduz a acção de “ir atrás” e define a atitude de um discípulo que aceita ligar-se a um “mestre”, escutar as suas lições e imitar os seus exemplos de vida… É, portanto, isso que Jesus pede a Mateus. Mateus, sem objecções nem pedidos de esclarecimento, deixa tudo e aceita ser discípulo, numa adesão plena, total e radical a Jesus e às suas propostas de vida. Mateus define aqui o caminho do verdadeiro discípulo: é aquele que, na sua vida normal, se encontra com Jesus, escuta o seu convite, aceita-o sem discussão e segue Jesus de forma incondicional. A esta adesão ao chamamento de Deus chama-se “fé”.
No relato de vocação de Mateus há, no entanto, um dado novo em relação a outros relatos de vocação: é que aqui, o “chamado” é um cobrador de impostos. Já sabemos que os cobradores de impostos eram gente desclassificada, excluída da vida social e religiosa do Povo de Deus, catalogada como pecadora, e sem qualquer possibilidade de salvação e de relação com Deus. Jesus, no entanto, pretende demonstrar que, na casa do “Reino”, há lugar para todos, mesmo para aqueles que o mundo considera desclassificados e marginais. Deus tem uma proposta de salvação para apresentar a todos os homens, sem excepção; e essa proposta não distingue entre bons e maus: é uma proposta que se destina a todos aqueles que estiverem interessados em acolhê-la.
Na segunda parte do nosso texto (vers. 10-13), temos uma controvérsia entre Jesus e os fariseus, porque Jesus – depois de convidar o publicano Mateus a integrar o seu grupo de discípulos (coisa inaudita, que nenhum “mestre” da época aceitaria) – ainda “desceu mais baixo” e aceitou sentar-Se à mesa com os publicanos e pecadores.
O “banquete” era, para a mentalidade judaica, o lugar do encontro, da fraternidade, onde os convivas estabeleciam laços de família e de comunhão. Sentar-se à mesa com alguém significava estabelecer laços profundos, íntimos, familiares, com essa pessoa. Por isso, o “banquete” é, para Jesus, o símbolo mais apropriado desse “Reino” de fraternidade, de comunhão, de amor sem limites, que Ele veio propor aos homens (Mt 22,1-14; cf. Mt 8,11-12). Ao sentar-Se à mesa com os publicanos e pecadores, Jesus está a dizer, de forma clara, que veio apresentar uma proposta de salvação para todos, sem excepção; e que nesse mundo novo, todos os homens e mulheres (independentemente das suas opções ou decisões erradas) têm lugar. A única condição que há para sentar-se à mesa do “Reino” é estar disposto a aceitar essa proposta que é feita por Jesus.
Os fariseus (que estão mais preocupados com as obras, com os comportamentos externos, com o cumprimento estrito da Lei) não entendem isto. Jesus recorda-lhes que “não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes” (vers. 12); e cita, a propósito, a frase de Oseias que encontramos na primeira leitura: “prefiro a misericórdia ao sacrifício” (vers. 13). Há, nas afirmações de Jesus, uma certa ironia: os fariseus julgavam-se justos e bons, porque cumpriam a Lei; mas, na perspectiva de Deus, os “justos” não são os que estão satisfeitos consigo próprios e vivem isolados na sua auto-suficiência, mas são todos aqueles que não se conformam com a triste situação em que vivem, estão dispostos a acolher o dom de Deus e a aderir à sua proposta de salvação.
Para Deus, o que é decisivo, portanto, não é o cumprimento estrito das regras, das leis e dos actos de culto; para Deus, o que é decisivo é estar disposto a acolher a proposta de salvação que Ele faz e a entregar-se confiadamente nas suas mãos. Todos aqueles que, na sua humildade e dependência, estão nesta atitude podem integrar a comunidade do “Reino” e fazer parte da comunidade de Jesus, da comunidade da salvação.
Deus chama todos os homens sem excepção. Os que se consideram bons e justos, frequentemente acham que não precisam do dom de Deus, pois eles merecem, pelos seus actos, a salvação; mas a verdade é que a salvação é sempre um dom gratuito de Deus, não merecido pelo homem… O que Deus pede ao homem (seja ele bom ou mau, pecador ou santo, justo ou injusto) é que aceite o dom de Deus, escute o chamamento de Jesus e, sem objecções, com total confiança e disponibilidade, aceite o convite para seguir Jesus, para ser seu discípulo e para integrar a comunidade do “Reino”.


* 2ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: 2 Coríntios 1, 1-7

Paulo, apóstolo de Cristo Jesus por vontade de Deus, e o irmão Timóteo, à igreja de Deus que está em Corinto, como a todos os santos que estão na Acaia inteira, 2a vós, graça e paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo. 3Bendito seja Deus e Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai das misericórdias e o Deus de toda a consolação! 4Ele nos consola em toda a nossa tribulação, para que também nós possamos consolar aqueles que estão em qualquer tribulação, mediante a consolação que nós mesmos recebemos de Deus. 5Na verdade, assim como abundam em nós os sofrimentos de Cristo, também, por meio de Cristo, é abundante a nossa consolação. 6Se somos atribulados, é, pois, para vossa consolação e salvação. Se somos consolados, é para vossa consolação, que vos faz suportar os mesmos sofrimentos que também nós padecemos. 7E a nossa esperança a respeito de vós é firme, porque sabemos que, assim como sois participantes dos nossos sofrimentos, também o haveis de ser da nossa consolação.

Evangelho: Mateus 5, 1-12

Naquele tempo, 1ao ver a multidão, Jesus subiu a um monte. Depois de se ter sentado, os discípulos aproximaram-se dele. 2Então tomou a palavra e começou a ensiná-los, dizendo: 3«Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino do Céu. 4Felizes os que choram, porque serão consolados. 5Felizes os mansos, porque possuirão a terra. 6Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. 7Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. 8Felizes os puros de coração, porque verão a Deus. 9Felizes os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus. 10Felizes os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o Reino do Céu. 11Felizes sereis, quando vos insultarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o género de calúnias contra vós, por minha causa. 12Exultai e alegrai-vos, porque grande será a vossa recompensa no Céu; pois também assim perseguiram os profetas que vos precederam.»

Reflexão

Nesta semana, e na próxima, escutaremos textos da Segunda Carta de Paulo aos Coríntios e do Sermão da Montanha apresentado por S. Mateus nos capítulos 5 a 7 do seu evangelho. Nos dois livros, somos desafiados por Cristo de modo forte e incisivo. Em Paulo, o desafio parte da imagem do servo do Evangelho, delineada na “orgulhosa” auto-biografia do Apóstolo de Jesus Cristo por vontade de Deus. Em Mateus, temos o desafio da identidade do discípulo evangélico, colocado por Jesus na dimensão da bem-aventurança, que vai mais além do que é comum. Mas tanto a carta de Paulo, como o sermão de Jesus, estão de acordo no anúncio e na experiência de uma felicidade. Paulo identifica a felicidade com a consolação recebida de Deus como dom, Pai misericordioso, e partilhada com os irmãos. Jesus assimila a felicidade à bem-aventurança, como consciência dos bens confiados à pessoa humana tornada discípula. Esta felicidade também se chama alegria, serenidade, exultação, bem-estar, fortuna, consolação e bem-aventurança. O homem anseia por esta felicidade, tanto como pessoa, como sociedade. O salmo responsorial reflecte esse anseio: «Procurei o Senhor e Ele atendeu-me… Este pobre clamou e o Senhor o ouviu, salvou-o de todas as angústias».
A condição para sermos consolados é aceitar, antes, a tribulação. Deus só pode consolar os que estão tristes, atribulados, desolados. É precisa uma situação negativa para que Deus possa realizar a sua obra positiva: «Felizes os que choram, porque serão consolados» (v. 4). E também Paulo escreve: «como abundam em nós os sofrimentos de Cristo, também, por meio de Cristo, é abundante a nossa consolação» (v. 5). É preciso lutar com Deus na desolação para receber a vitória, a consolação divina, porque não há vitória sem combate.
A desolação pode ser pesada e tornar-se tentação para deixar de acreditar em Deus. Mas é na desolação que Deus quer consolar-nos. E consola-nos se lutamos e permanecemos firmes na fé e na esperança.
A luta trava-se na oração, talvez difícil, porque a verdadeira desolação faz-nos sentir a oração penosa. Mas é preciso permanecer junto à cruz do Senhor, para que os nossos sofrimentos se tornem sofrimentos de Cristo, prelúdio de vitória e de consolação, que nos devolvem a certeza feliz de que Deus nos ama e está connosco. As tribulações de Paulo, e o seu estado de desolação, são provocados pelo ardor em pregar o Evangelho, surgem no seu coração de apóstolo: «Se somos atribulados, é, pois, para vossa consolação e salvação. Se somos consolados, é para vossa consolação, que vos faz suportar os mesmos sofrimentos que também nós padecemos» (v. 6). É pois um caminho para todos, particularmente para aqueles que querem ser verdadeiros apóstolos.
Como dehonianos, queremos ser «servidores da reconciliação» (Cst 7), em união «com a oblação reparadora de Cristo ao Pai pelos homens» (Cst 6). Na nossa solidariedade com Cristo nada de essencial temos para Lhe dar; é uma solidariedade de comunhão com Ele (cf. Gl 2, 20). Completamos na nossa “carne o que falta aos sofrimentos de Cristo pelo Seu Corpo que é a Igreja” (Cl 1, 24). O que falta aos sofrimentos de Cristo são os sofrimentos dos seus enviados, dos seus missionários, que vão levar a Boa Notícia da Salvação realizada na morte e ressurreição do Senhor até aos confins da Terra.


* 3ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: 2 Coríntios 1, 18-22

Irmãos, Deus é testemunha de que a nossa palavra dirigida a vós não é «sim» e «não.» 19Pois o Filho de Deus, Jesus Cristo, aquele que foi por nós anunciado entre vós, por mim, por Silvano e por Timóteo, não foi um «sim» e um «não», mas unicamente um «sim.» 20Nele todas as promessas de Deus se tornaram «sim» e é por isso que, graças a Ele, nós podemos dizer o «ámen» para glória de Deus. 21Aquele que nos confirma juntamente convosco em Cristo e nos dá a unção é Deus, 22Ele que nos marcou com um selo e colocou em nossos corações o penhor do Espírito.

Evangelho: Mateus 5, 13-16

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 13«Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal se corromper, com que se há-de salgar? Não serve para mais nada, senão para ser lançado fora e ser pisado pelos homens. 14Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre um monte; 15nem se acende a candeia para a colocar debaixo do alqueire, mas sim em cima do candelabro, e assim alumia a todos os que estão em casa. 16Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, de modo que, vendo as vossas boas obras, glorifiquem o vosso Pai, que está no Céu.»

Reflexão

As leituras de hoje podem levar-nos a meditar sobre a fidelidade. «Vós sois o sal da terra», diz o Senhor. O sal deve manter-se fiel a si mesmo, e salgar. Também o discípulo de Cristo deve ser fiel à sua condição de filho de Deus, para impedir que o mundo, que tende à corrupção, apodreça. «Vós sois a luz do mundo»: uma luz acesa não deve apagar-se, mas iluminar «a todos os que estão em casa».
Paulo responde àqueles que o criticam e julgam inconstante, e afirma a sua fidelidade a Deus: «Deus é testemunha de que a nossa palavra dirigida a vós não é «sim» e «não» (v. 18). Deus é constante e permanece constante em tudo o que faz. Jamais desanima perante os obstáculos que se levantam contra a sua acção. Procura o bem que planeou, e ama com absoluta fidelidade: Deus é fiel. Deus não é “sim” e “não”. Em Jesus, foi “sim”. O que Jesus nos pede - «brilhe a vossa luz diante dos homens, de modo que, vendo as vossas boas obras, glorifiquem o vosso Pai, que está no Céu » - já Ele mesmo o fez. Filho do Pai, glorificou-O sendo o “sim” de Deus. Jesus pôs o “sim” em todas as promessas de Deus, que nele foram plenamente realizadas. Jesus foi “sim” fazendo sempre a vontade do Pai: «faço sempre aquilo que lhe agrada» (Jo 8, 29). Por isso, podemos e devemos apoiar-nos nele com segurança, pois somos homens inconstantes, que encontram sempre razões para serem infiéis. Deus, pelo contrário, ama-nos sempre, usa de misericórdia para connosco sempre, e sempre nos apoia nas provações.
Acolhamos a fidelidade de Deus, cujo pensamento nos enche de alegria. A nossa fidelidade, como pessoas e como comunidades, exige uma intensa vida de oração. O mesmo se diga da fecundidade do nosso apostolado: «Reconhecemos que da oração assídua dependem a fidelidade de cada um e das nossas comunidades, bem como a fecundidade do nosso apostolado» (Cst 76). Peçamos ao Senhor a graça de fortalecer a nossa fidelidade para com Ele, para que as nossas iniciativas apostólicas sejam fecundas e todos vejam as nossas boas obras e O glorifiquem.


* 4ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: 2 Coríntios 3, 4-11

Irmãos, é por meio de Cristo, que temos esta confiança diante de Deus. 5Não é que sejamos capazes de conceber alguma coisa como de nós mesmos; é de Deus que provém a nossa capacidade. 6É Ele que nos torna aptos para sermos ministros de uma nova aliança, não da letra, mas do Espírito; porque a letra mata, enquanto o Espírito dá a vida. 7Ora se o ministério da morte, gravado com letras em pedra, foi de tal glória que os filhos de Israel não podiam fixar o rosto de Moisés, por causa do esplendor que nele havia, aliás passageiro, 8quanto mais glorioso não será o ministério do Espírito? 9Na verdade, se o ministério da condenação foi glorioso, muito mais rico de glória será o ministério da justiça. 10Mesmo até o que, sob tal aspecto, foi glorioso, deixou de o ser por causa da glória eminentemente superior. 11Se, com efeito, foi glorioso o que era transitório, muito mais glorioso é o que permanece.

Evangelho: Mateus 5, 17-19

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 17 «Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas. Não vim revogá-los, mas levá-los à perfeição. 18Porque em verdade vos digo: Até que passem o céu e a terra, não passará um só jota ou um só ápice da Lei, sem que tudo se cumpra. 19Portanto, se alguém violar um destes preceitos mais pequenos, e ensinar assim aos homens, será o menor no Reino do Céu. Mas aquele que os praticar e ensinar, esse será grande no Reino do Céu.

Reflexão

Na primeira leitura, Paulo manifesta o seu entusiasmo pela Nova Aliança, dom da Santíssima Trindade aos homens. O Pai, o Filho e o Espírito Santo convidam-nos a entrar na sua intimidade, a participar da sua vida divina. O Apóstolo não cabe em si ao pensar que foi tornado ministro desta Aliança no Espírito, o que lhe permite ter confiança diante de Deus Pai, por meio de Cristo. O dom da Nova Aliança repete-se especialmente na Eucaristia, onde o sacerdote repete as palavras de Jesus: «Este cálice é a Nova Aliança no meu sangue» (Lc 22, 20).
Alegremo-nos também nós pela Nova Aliança oferecida pela Santíssima Trindade à Igreja, Aliança que renova todas as coisas, que nos põe em novidade de vida, tornando-nos participantes da morte e da ressurreição de Cristo. O sangue da Nova Aliança, que recebemos na Eucaristia, une-nos a Ele, Mediador da Nova Aliança.
Paulo compara a Antiga e a Nova Aliança. A Antiga, diz o Apóstolo, foi escrita em tábuas de pedra. É uma clara alusão à aliança do Sinai, quando Deus gravou em pedra os mandamentos, a Lei, que Israel tinha de observar para permanecer na Aliança. A essa Aliança “da pedra”, Paulo opõe a Nova Aliança “do Espírito”. A primeira é feita de leis exteriores. A segunda, a aliança do Espírito, é interior e escrita nos corações, como diz Jeremias.
Trata-se, mais precisamente, de uma transformação do coração. Deus dá-nos um coração novo para nele infundir um Espírito novo, o Espírito de Deus. É ele a Nova Aliança, é Ele a nova lei interior. Já não se trata de uma lei feita de mandamentos exteriores, mas de uma lei que consiste num impulso interior, no gosto em fazer a vontade de Deus, num desejo de corresponder em tudo ao amor que vem de Deus e nos guia para Deus, ao amor que nos torna participantes da vida da Santíssima Trindade. «A letra mata», diz Paulo, «o Espírito dá vida». A letra mata porque se trata de preceitos que, não sendo observados, provocam a condenação. O Espírito, pelo contrário dá vida porque torna capazes de fazer a vontade de Deus, e a vontade divina é sempre vivificante. O Espírito é vida, é um dinamismo interior. Por isso é que a glória da Nova Aliança é muito superior à da Antiga.
Traduzindo o pensamento do Apóstolo em termos mais compreensíveis à nossa mentalidade actual, poderíamos parafrasear as suas palavras do seguinte modo: «Se te deténs na superfície da letra, corres o risco de bloquear a vitalidade do Espírito; portanto, avança para a profundidade da criatividade espiritual». Também o axioma de Jesus se pode parafrasear: «Vai sempre mais além, amadurecendo na liberdade, em obediência e testemunho, serve o reino dos céus».
A realidade do «homem de coração novo, animado pelo Espírito», que nasce do «Coração de Jesus, aberto na cruz» (Cst 3) é um tema importante para o Pe. Dehon e para nós. Um «coração novo animado pelo Espírito» é espiritualmente criativo e profundo, é um coração livre e obediente, é um coração que testemunha e serve o Reino.


* 5ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: 2 Coríntios 5, 15-4, 1.3-6

Irmãos, até hoje, todas as vezes que se lêem os escritos de Moisés, um véu cobre o coração dos filhos de Israel. 16Mas, quando se converterem ao Senhor, o véu será tirado. 17Ora, o Senhor é o Espírito e onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade. 18E nós todos que, com o rosto descoberto, reflectimos a glória do Senhor, somos transfigurados na sua própria imagem, de glória em glória, pelo Senhor que é Espírito. 1Por isso, investidos neste ministério que nos foi concedido por misericórdia, não perdemos a coragem, 2mas repudiamos os subterfúgios vergonhosos, não procedendo com astúcia nem adulterando a palavra de Deus, antes, pela manifestação da verdade, recomendando-nos à consciência de todos os homens diante de Deus. 3Se, entretanto, o nosso Evangelho continuar velado, está velado para os que se perdem, 4para os incrédulos, cuja inteligência o deus deste mundo cegou, a fim de não verem brilhar a luz do Evangelho da glória de Cristo, que é imagem de Deus. 5Pois, não nos pregamos a nós mesmos, mas a Cristo Jesus, o Senhor, e nos consideramos vossos servos, por amor de Jesus. 6Porque o Deus que disse: das trevas brilhe a luz, foi quem brilhou nos nossos corações, para irradiar o conhecimento da glória de Deus, que resplandece na face de Cristo.

Evangelho: Mateus 5, 20-26

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 20Se a vossa justiça não superar a dos doutores da Lei e dos fariseus, não entrareis no Reino do Céu.» 21«Ouvistes o que foi dito aos antigos: Não matarás. Aquele que matar terá de responder em juízo. 22Eu, porém, digo-vos: Quem se irritar contra o seu irmão será réu perante o tribunal; quem lhe chamar ‘imbecil’ será réu diante do Conselho; e quem lhe chamar ‘louco’ será réu da Geena do fogo. 23Se fores, portanto, apresentar uma oferta sobre o altar e ali te recordares de que o teu irmão tem alguma coisa contra ti, 24deixa lá a tua oferta diante do altar, e vai primeiro reconciliar-te com o teu irmão; depois, volta para apresentar a tua oferta. 25Com o teu adversário mostra-te conciliador, enquanto caminhardes juntos, para não acontecer que ele te entregue ao juiz e este à guarda e te mandem para a prisão. 26Em verdade te digo: Não sairás de lá até que pagues o último centavo.»

Reflexão

Na página da Segunda Carta aos Coríntios, que hoje escutamos, Paulo inspira-se na narrativa da Criação para falar do esplendor da vocação cristã: «Deus disse: das trevas brilhe a luz», «brilhou nos nossos corações, para irradiar o conhecimento da glória de Deus, que resplandece na face de Cristo» (v. 6). Quem está em Cristo é uma nova criatura. É imagem de Deus na semelhança com Cristo. O homem foi criado à imagem de Deus: «Façamos o ser humano à nossa imagem e semelhança» (Gn 1, 26). Mas só Cristo é imagem perfeita de Deus. Nós somos chamados a reflectir, como num espelho, a glória do Senhor, para sermos transformados nessa mesma imagem «de glória em glória» (2 Cor 3, 18).
A vocação cristã leva-nos a duas atitudes fundamentais. A primeira é contemplar o rosto do Senhor. Só quem contempla o Senhor se deixa iluminar por Ele e pode reflectir a sua glória. Para sermos cristãos significativos, precisamos de nos colocar diante do Senhor como a planta verde diante do Sol. Então receberemos a energia necessária para viver e crescer na fé, para a testemunhar, e ajudar outros à mesma vivência, crescimento e testemunho. «Vinde e sereis iluminados», diz um salmo. A escuta e a meditação da Palavra, a oração, a adoração eucarística, são excelentes meios para contemplar o Senhor, para sermos iluminados para nos enchermos do seu Espírito «que dá vida», que nos transforma interiormente, fazendo-nos, cada vez mais, imagem de Cristo, que faz de nós brilhantes faróis nas costas do mar bravo, que é este mundo.
No evangelho, Jesus convida-nos a abrir o coração à caridade que brota do seu Coração, a ultrapassar a justiça dos escribas e dos fariseus, que não está orientada para o amor: «Ouvistes o que foi dito aos antigos: Não matarás. Aquele que matar terá de responder em juízo. Eu, porém, digo-vos: Quem se irritar contra o seu irmão será réu perante o tribunal» (vv. 21-22). Mas também nos explica o modo como fazer as nossas ofertas a Deus: «Se fores, portanto, apresentar uma oferta sobre o altar e ali te recordares de que o teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa lá a tua oferta diante do altar, e vai primeiro reconciliar-te com o teu irmão; depois, volta para apresentar a tua oferta» (vv. 23-24). Este modo de proceder é ainda mais necessário depois que a Eucaristia foi instituída. Ir ao altar é ir à fonte do amor, é acolher todo o Corpo de Cristo, é comunhão com Ele e com os irmãos. Não podemos receber a Cabeça, que é Cristo, e recusar o Corpo de Cristo, que são os irmãos. «Em Cristo, Deus reconciliou consigo o mundo», escreve Paulo. Se quisermos reflectir a glória do Senhor, havemos de deixar-nos ensopar pela sua mansidão, pedir a graça de um coração semelhante ao dele. Se acolhemos Jesus que Se deu a nós na Eucaristia, que Se pôs totalmente ao nosso serviço, temos que nos pôr também ao serviço dos irmãos. Havemos de procurar Aquele que vive, Cristo, nos que vivem ao nosso lado, nos irmãos. Adoramos neles a presença real de Cristo; servimo-l´O neles. Se dissemos “sim” ao amor de Cristo, devemos dizer “sim” ao amor dos irmãos. Assim Cristo continua em nós a Sua Missa, a Sua missão de caridade e de salvação do mundo. A Eucaristia celebrada, comungada, adorada, lança-nos «incessantemente, pelos caminhos do mundo ao serviço do Evangelho» (Cst 82).


* 6ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: 2 Coríntios 4, 7-15

Irmãos, nós trazemos em vasos de barro o tesouro do nosso ministério, para que se veja que este extraordinário poder é de Deus e não é nosso. 8Em tudo somos atribulados, mas não esmagados; confundidos, mas não desesperados; 9perseguidos, mas não abandonados; abatidos, mas não aniquilados. 10Trazemos sempre no nosso corpo a morte de Jesus, para que também a vida de Jesus seja manifesta no nosso corpo. 11Estando ainda vivos, estamos continuamente expostos à morte por causa de Jesus, para que a vida de Jesus seja manifesta também na nossa carne mortal. 12Assim, em nós opera a morte, e em vós a vida. 13Animados do mesmo espírito de fé, conforme o que está escrito: Acreditei e por isso falei, também nós acreditamos e por isso falamos, 14sabendo que aquele que ressuscitou o Senhor Jesus, também nos há-de ressuscitar com Jesus, e nos fará comparecer diante dele junto de vós. 15E tudo isto faço por vós, para que a graça, multiplicando-se na comunidade, faça aumentar a acção de graças, para a glória de Deus.

Evangelho: Mateus 5, 27-32

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 27«Ouvistes o que foi dito: Não cometerás adultério. 28Eu, porém, digo-vos que todo aquele que olhar para uma mulher, desejando-a, já cometeu adultério com ela no seu coração. 29Portanto, se a tua vista direita for para ti origem de pecado, arranca-a e lança-a fora, pois é melhor perder-se um dos teus órgãos do que todo o teu corpo ser lançado à Geena. 30E se a tua mão direita for para ti origem de pecado, corta-a e lança-a fora, porque é melhor perder-se um só dos teus membros do que todo o teu corpo ser lançado à Geena.» 31«Também foi dito: Aquele que se divorciar da sua mulher, dê-lhe documento de divórcio. 32Eu, porém, digo-vos: Aquele que se divorciar da sua mulher - excepto em caso de união ilegal - expõe-na a adultério, e quem casar com a divorciada comete adultério.»

Reflexão

Cristo, misericórdia de Deus, morreu na cruz para nos salvar. O cristão é chamado a partilhar esse mistério de morte, que leva à vida.
Na primeira leitura, esse mistério é expresso por Paulo quando fala do clima de perseguição em que exerce o seu ministério, isto é, quando proclama a ressurreição do Senhor no meio de muitas tribulações: «Somos atribulados, mas não esmagados; confundidos, mas não desesperados; perseguidos, mas não abandonados; abatidos, mas não aniquilados.» (vv. 8-9). Parece um discurso ilógico, e é desconcertante. É desconcertante se não se relacionar com o mistério de Cristo. Paulo acrescenta: «Trazemos sempre no nosso corpo a morte de Jesus, para que também a vida de Jesus seja manifesta no nosso corpo» (v. 10). Deus colocou nos vasos de barro da nossa pobre humanidade, pelo mistério de Cristo, o tesouro da sua ressurreição, «para que a vida de Jesus seja manifesta também na nossa carne mortal» (v. 11). Não podemos pretender uma vida tranquila, sem dificuldades, sem provações, sem perturbações. Não foi esse o caminho do Senhor, e não pode ser esse o nosso caminho. Que o Senhor nos ajude a ver em todos os sofrimentos a sua cruz, isto é, a passagem para a vida.
As palavras duras do Evangelho pretendem alertar-nos para atitudes de condescendência e de cedências para com a nossa sociedade permissiva, que apenas busca a satisfação imediata, a felicidade aparente que a droga, o divórcio, o aborto, o desregramento sexual parecem dar. A nossa sociedade proclama diversas “libertações”, em que facilmente nos podemos deixar levar, sem nos darmos conta da degradação da nossa dignidade humana. As tremendas palavras do Senhor: «Se a tua vista direita for para ti origem de pecado, arranca-a e lança-a fora… se a tua mão direita for para ti origem de pecado, corta-a e lança-a fora…», expressam a decisão com que havemos de evitar o mal e procurar o bem. O “bem” é tudo aquilo que nos permite realizar-nos como pessoas humanas, criadas à imagem de Deus, e destinadas à comunhão com Ele. Tudo aquilo que dificulte ou impeça a realização dessa fundamental vocação do homem há ser deitado fora, custe o que custar. Como dizem as nossas Constituições, «Partilhamos as aspirações dos nossos contemporâneos, como abertura possível ao advento de um mundo mais humano, ainda que elas contenham o risco de um malogro e de uma degradação» (Cst 37). Há iniciativas que exigem um grande sentido de responsabilidade e nas quais os cristãos, e particularmente, os religiosos podem e devem colaborar. Mas é sempre necessário um sábio discernimento pessoal e comunitário, para não serem instrumentalizados e não favorecerem maiores abusos e injustiças.
Que o Senhor nos encha do seu Espírito, nos afaste do mal e nos impulsione para o bem. Que nos faça «luz do mundo».


* SÁBADO - Anos Ímpares

Primeira leitura: 2 Coríntios 5, 14-21

Irmãos, o amor de Cristo nos absorve completamente, ao pensar que um só morreu por todos e, portanto, todos morreram. 15Ele morreu por todos, a fim de que, os que vivem, não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou. 16Por conseguinte, de agora em diante, não conhecemos ninguém à maneira humana. Ainda que tenhamos conhecido a Cristo desse modo, agora já não o conhecemos assim. 17Por isso, se alguém está em Cristo, é uma nova criação. O que era antigo passou; eis que surgiram coisas novas. 18Tudo isto vem de Deus, que nos reconciliou consigo por meio de Cristo e nos confiou o ministério da reconciliação. 19Pois foi Deus quem reconciliou o mundo consigo, em Cristo, não imputando aos homens os seus pecados, e pondo em nós a palavra da reconciliação. 20É em nome de Cristo, portanto, que exercemos as funções de embaixadores e é Deus quem, por nosso intermédio, vos exorta. Em nome de Cristo suplicamo-vos: reconciliai-vos com Deus. 21Aquele que não havia conhecido o pecado, Deus o fez pecado por nós, para que nos tornássemos, nele, justiça de Deus.

Evangelho: Mateus 5, 33-37

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 33«Do mesmo modo, ouvistes o que foi dito aos antigos: Não perjurarás, mas cumprirás diante do Senhor os teus juramentos. 34Eu, porém, digo-vos: Não jureis de maneira nenhuma: nem pelo Céu, que é o trono de Deus, 35nem pela Terra, que é o estrado dos seus pés, nem por Jerusalém, que é a cidade do grande Rei. 36Não jures pela tua cabeça, porque não tens poder de tornar um só dos teus cabelos branco ou preto. 37Seja este o vosso modo de falar: Sim, sim; não, não. Tudo o que for além disto procede do espírito do mal.»

Reflexão

Paulo afirma na primeira leitura: «Ele morreu por todos, a fim de que, os que vivem, não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou» (v. 15). A liturgia da Igreja retomou este conceito, transformando-o em oração: «E a fim de vivermos, não já para nós próprios, mas para Ele, que por nós morreu e ressuscitou, de Vós, Pai misericordioso, enviou aos que n´Ele crêem o Espírito Santo…» (Oração eucarística IV). Há uma espécie de troca: Cristo morreu por nós a fim de que possamos viver para Ele. Paulo toma muito a sério a morte de Cristo por todos: «um só morreu por todos e, portanto, todos morreram» (v. 14). Cristo assumiu a nossa morte, mas para a transformar. Morremos numa oferta, e isto faz da nossa morte uma passagem para Deus. É graça que recebemos em Cristo.
Mas a liturgia utiliza uma outra perícopa, que se refere à reconciliação: «Foi Deus quem reconciliou o mundo consigo, em Cristo» (v. 19). Na fórmula da absolvição sacramental, o sacerdote reza: «Deus, Pai de misericórdia, que, pela morte e ressurreição de Cristo, reconciliou o mundo consigo…». A redenção não foi uma luta entre Cristo e Deus, como às vezes se pensa, como se Deus quisesse a nossa perdição, e Cristo tivesse querido evitar tal desgraça, oferecendo a sua vida por nós. Não. Foi Deus que quis reconciliar o mundo consigo. A redenção nasce do coração de Deus: «Tudo vem de Deus», afirma o Apóstolo. E tudo passa pelo coração de Cristo, porque o Pai nos reconcilia «em Cristo». Cristo é fiel ao Pai e realiza a sua vontade. Salva-nos com o Pai, e não contra a vontade do Pai. A graça, o amor, a novidade de vida, brotam do coração do Pai: «Deus, que nos amou e enviou o seu Filho como vítima de expiação pelos nossos pecados» (1 Jo 4, 10).
No evangelho, continuamos a escutar o Sermão da Montanha, uma mensagem que configura uma espécie de bem-aventurança do “sim, sim” e “não, não”. Aquele que, por vontade do Pai nos salvou, exige de nós, seus discípulos, clareza de convicções, de posições e de comportamentos. Não admite em nós aquela conduta que agora expressamos com um neologismo, o “nim”, talvez útil a quem prefere equilibrismos, indeterminação, meias tintas, atrasos e adiamentos nebulosos, navegar em águas turvas. A exigência do rabi de Nazaré raia a intolerância: tudo o que for além do “sim, sim” e “não, não», vem do espírito do mal. Mas o «em verdade vos digo», remete para a autoridade das suas palavras e, sobretudo, para a autoridade da sua personalidade. Paulo descobriu que Cristo foi “sim”,

Ricardo Igreja

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