terça-feira, 15 de novembro de 2011

SOLENIDADE

* Jesus Cristo, Rei do Universo


"Em verdade vos digo:
Quantas vezes o deixastes de fazer a um dos meus irmãos mais pequeninos,
também a Mim o deixastes de fazer"


LEITURA I – Ez 34,11-12.15-17

Eis o que diz o Senhor Deus: «Eu próprio irei em busca das minhas ovelhas e hei-de encontrá-las. Como o pastor vigia o seu rebanho, Quando estiver no meio das ovelhas que andavam tresmalhadas, para as tirar de todos os sítios em que se desgarraram num dia de nevoeiro e de trevas. Eu apascentarei as minhas ovelhas, Eu as levarei a repousar, diz o Senhor. Hei-de procurar a que anda tresmalhada. Tratarei a que estiver ferida, darei vigor à que andar enfraquecida E velarei pela gorda e vigorosa. Hei-de apascentá-las com justiça. Quanto a vós, meu rebanho, assim fala o Senhor Deus: Hei-de fazer justiça entre ovelhas e ovelhas, entre carneiros e cabritos».

LEITURA II – 1 Cor 15,20-26.28

Irmãos: Cristo ressuscitou dos mortos, como primícias dos que morreram. Uma vez que a morte veio por um homem, também por um homem veio a ressurreição dos mortos; porque, do mesmo modo que em Adão todos morreram, assim também em Cristo serão todos restituídos à vida. Cada qual, porém, na sua ordem: primeiro, Cristo, como primícias; a seguir, os que pertencem a Cristo, por ocasião da sua vinda. Depois será o fim, quando Cristo entregar o reino a Deus seu Pai. É necessário que Ele reine, até que tenha posto todos os inimigos debaixo dos seus pés. E o último inimigo a ser aniquilado é a morte, porque Deus «tudo submeteu debaixo dos seus pés». Quando todas as coisas Lhe forem submetidas, então também o próprio Filho Se há-de submeter àquele que Lhe submeteu todas as coisas, para que Deus seja tudo em todos.

EVANGELHO – Mt 25,31-46

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: «Quando o Filho do homem vier na sua glória com todos os seus Anjos, sentar-Se-á no seu trono glorioso. Todas as nações se reunirão na sua presença e Ele separará uns dos outros, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos; e colocará as ovelhas à sua direita e os cabritos à sua esquerda. Então o Rei dirá aos que estiverem à sua direita: ‘Vinde, bem ditos de meu Pai; recebei como herança o reino que vos está preparado desde a criação do mundo. Porque tive fome e destes-Me de comer; tive sede e destes-me de beber; era peregrino e Me recolhestes; não tinha roupa e Me vestistes; estive doente e viestes visitar-Me; estava na prisão e fostes ver-Me’. Então os justos Lhe dirão: ‘Senhor, quando é que Te vimos com fome e Te demos de comer, ou com sede e Te demos de beber? Quando é que Te vimos peregrino e te recolhemos, ou sem roupa e Te vestimos? Quando é que Te vimos doente ou na prisão e Te fomos ver?’ E o Rei lhes responderá: ‘Em verdade vos digo: Quantas vezes o fizestes a um dos meus irmãos mais pequeninos, a Mim o fizestes’. Dirá então aos que estiverem à sua esquerda: ‘Afastai-vos de Mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o demónio e os seus anjos. Porque tive fome e não Me destes de comer; tive sede e não Me destes de beber; era peregrino e não Me recolhestes; estava sem roupa e não Me vestistes; estive doente e na prisão e não Me fostes visitar’. Então também eles Lhe hão-de perguntar: ‘Senhor, quando é que Te vimos com fome ou com sede, peregrino ou sem roupa, doente ou na prisão, e não Te prestámos assistência?’ E Ele lhes responderá: ‘Em verdade vos digo: Quantas vezes o deixastes de fazer a um dos meus irmãos mais pequeninos, também a Mim o deixastes de fazer’. Estes irão para o suplício eterno e os justos para a vida eterna».

REFLEXÃO

A parábola do juízo final começa com uma introdução (vers. 31-33) que apresenta o quadro: o “Filho do Homem” sentado no seu trono, a separar as pessoas umas das outras “como o pastor separa as ovelhas dos cabritos”.

Vêm, depois, dois diálogos. Um, entre “o rei” e “as ovelhas” que estão à sua direita (vers. 34-40); outro, entre “o rei” e os “cabritos” que estão à sua esquerda (vers. 41-46). No primeiro diálogo, o “rei” acolhe as “ovelhas” e convida-as a tomar posse da herança do “Reino”; no segundo diálogo, o “rei” afasta os “cabritos” e impede-os de tomar posse da herança do Reino. Porquê? Qual é o critério que “o rei” utiliza para acolher uns e rejeitar outros?

A questão decisiva parece ser, na perspectiva de Mateus, a atitude de amor ou de indiferença para com os irmãos mais pequenos de Jesus, que se encontram em situações dramáticas de necessidade – os que têm fome, os que têm sede, os peregrinos, os que não têm que vestir, os que estão doentes, os que estão na prisão… Jesus identifica-Se com os pequenos, os pobres, os débeis, os marginalizados; manifestar amor e solidariedade para com o pobre é fazê-lo ao próprio Jesus e manifestar egoísmo e indiferença para com o pobre é fazê-lo ao próprio Jesus.

A cena pode interpretar-se de duas maneiras, dependendo de como entendemos a palavra “irmão”. Entendida em sentido genérico, a palavra “irmão” designaria qualquer homem; neste caso, a exortação de Jesus convida os que querem entrar no Reino a ir ao encontro de qualquer homem que tenha fome, que tenha sede, que seja peregrino, que esteja nu, esteja doente ou que esteja na prisão, para lhe manifestar amor e solidariedade. Entendida num sentido mais restrito, a palavra “irmão” designaria os membros da comunidade cristã… De qualquer forma, os dois sentidos não se excluem; e é possível que Mateus se refira às duas realidades.

A exortação que Mateus lança à sua comunidade cristã (e às comunidades cristãs de todos os tempos e lugares) nas parábolas precedentes ganha, assim, uma força impressionante à luz desta cena final. Com os dados que este Evangelho nos apresenta, fica perfeitamente evidente que “estar vigilantes e preparados” (que é o grande tema do “discurso escatológico” dos capítulos 24 e 25) consiste, principalmente, em viver o amor e a solidariedade para com os pobres, os pequenos, os desprotegidos, os marginalizados. Em última análise, é esse o critério que decide a entrada ou a não entrada no Reino de Deus.

Esta exortação dirige-se a uma comunidade que negligencia o amor aos irmãos, que vive na indiferença ao sofrimento dos mais débeis, que é insensível ao drama dos pobres e que não cuida dos pequenos e dos desprotegidos. Como essas são atitudes que não se coadunam com a lógica do Reino, quem vive desse jeito não poderá fazer parte do Reino.

A cena do juízo final será uma descrição exacta e fotográfica do que vai acontecer no final dos tempos?

É claro que não. Mateus não é um repórter, mas um catequista a instruir a sua comunidade sobre os critérios e as lógicas de Deus. O objectivo do catequista Mateus é deixar bem claro que Deus não aprova uma vida conduzida por critérios de egoísmo, onde não há lugar para o amor a todos os irmãos, particularmente aos mais pobres e débeis. Um dos pormenores mais sugestivos é a identificação de Cristo com os famintos, os abandonados, os pequenos, os desprotegidos: todos eles são membros de Cristo e não os amar é não amar Cristo. Dizer que se ama Cristo e não viver do jeito de Cristo, no amor a todos os homens, é uma mentira e uma incoerência.

Deus condena os maus (“os cabritos”) ao inferno? Não. Deus não condena ninguém. Quem se condena ou não é o homem, na medida em que não aceita ou aceita a vida que Deus lhe oferece. E haverá alguém que, tendo consciência plena do que está em jogo, rejeite o amor e escolha, em definitivo, o egoísmo, o orgulho, a auto-suficiência – isto é, o afastamento definitivo de Deus e do Reino? Haverá alguém que, percebendo o sem sentido dessas opções, se obstine nelas por toda a eternidade?

Então, porque é que Mateus põe Deus a dizer aos “cabritos”: “afastai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e para os seus anjos”? Porque Mateus é um pregador veemente, que usa a técnica dos pregadores da época e gosta de recorrer a imagens fortes que toquem o auditório e que o levem a sentir-se interpelado. Para além dos exageros de linguagem, a mensagem é esta: o egoísmo e a indiferença para com o irmão não têm lugar no Reino de Deus.

Ricardo Igreja

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