quinta-feira, 21 de julho de 2011

XX DOMINGO TEMPO COMUM

* DOMINGO


 «Mulher, é grande a tua fé. Faça-se como desejas»


LEITURA I – Is 56,1.6-7

Eis o que diz o Senhor: «Respeitai o direito, praticai a justiça, porque a minha salvação está perto e a minha justiça não tardará a manifestar-se. Quanto aos estrangeiros que desejam unir-se ao Senhor para O servirem, para amarem o seu nome e serem seus servos, se guardarem o sábado, sem o profanarem, se forem fiéis à minha aliança, hei-de conduzi-los ao meu santo nome, hei-de enchê-los de alegria na minha casa de oração. Os seus holocaustos e os seus sacrifícios serão aceites no meu altar, porque a minha casa será chamada casa de oração para todos os povos».

LEITURA II – Rom 11,13-15.29-32

Irmãos: É a vós, os gentios, que eu falo: Enquanto eu for Apóstolo dos gentios, procurarei prestigiar o meu ministério a ver se provoco o ciúme dos homens da minha raça e salvo alguns deles. Porque, se da sua rejeição resultou a reconciliação do mundo, o que será a sua reintegração senão uma ressurreição de entre os mortos? Porque os dons e o chamamento de Deus são irrevogáveis. Vós fostes outrora desobedientes a Deus e agora alcançastes misericórdia, devido à desobediência dos judeus. Assim também eles desobedeceram agora, devido à misericórdia que alcançastes, para que, por sua vez, também eles alcancem agora misericórdia. Efectivamente, Deus encerrou a todos na desobediência, para usar de misericórdia para com todos.

EVANGELHO – Mt 15,21-28

Naquele tempo, Jesus retirou-Se para os lados de Tiro e Sidónia. Então, uma mulher cananeia, vinda daqueles arredores, começou a gritar: «Senhor, Filho de David, tem compaixão de mim. Minha filha está cruelmente atormentada por um demónio». Mas Jesus não lhe respondeu uma palavra. Os discípulos aproximaram-se e pediram-Lhe: «Atende-a, porque ela vem a gritar atrás de nós». Jesus respondeu: «Não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel». Mas a mulher veio prostrar-se diante d’Ele, dizendo: «Socorre-me, Senhor». Ele respondeu: «Não é justo que se tome o pão dos filhos para o lançar aos cachorrinhos». Mas ela replicou: «É verdade, Senhor; mas também os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa de seus donos». Então Jesus respondeu-lhe: «Mulher, é grande a tua fé. Faça-se como desejas». E, a partir daquele momento, a sua filha ficou curada.

REFLEXÃO

Consideremos, em primeiro lugar, a figura da mulher fenícia… As suas três intervenções mostram, por um lado, a sua ânsia de salvação; e, por outro, a fé firme e convicta que a anima (as designações “filho de David” – que equivale a “Messias” – e “Senhor” – “Kyrios” – com que ela se dirige a Jesus, lidas em contexto cristão, equivalem a uma confissão de fé). É uma figura que nos impressiona pela fé, pela humildade e também pelo sofrimento que transparece no seu apelo.
Surpreende-nos depois, numa primeira leitura, a forma dura como Jesus trata esta mulher que pede ajuda. Ele começa por passar em silêncio, aparentemente insensível aos apelos da mulher (vers. 23). Depois, perante a insistência dos discípulos, responde: “não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel” (vers. 24). Finalmente, diante do dramático último apelo da mulher (“socorre-me, Senhor”), responde: “não é justo que se tome o pão dos filhos para o lançar aos cães” (vers. 26).
Como entender esta atitude rude e insensível do mestre galileu, sempre preocupado em traduzir em gestos concretos o amor e a misericórdia de Deus pelos homens? A reacção de Jesus será fruto da convicção de que, de acordo com o plano de Deus, a salvação devia derramar-se, em primeiro lugar, pelos judeus, antes de alcançar os gentios?
A atitude de Jesus faz sentido, se a virmos como uma estratégia pedagógica, destinada a mostrar o sem sentido dos preconceitos judaicos contra os pagãos. Jesus conduziu o jogo de forma a demonstrar como eram ridículas as atitudes de discriminação dos pagãos, propostas pela catequese oficial judaica. Endurecendo progressivamente a sua atitude face ao apelo que lhe foi feito pela “cananeia”, Jesus dá à mulher a possibilidade de demonstrar a firmeza e a convicção da sua fé e prova aos judeus que os pagãos são bem dignos – talvez mais dignos do que esses “santos” membros do Povo de Deus – de se sentar à mesa do Reino. Esta mulher, na sua humildade, nem sequer reivindica equiparar-se a esse Povo eleito, convidado por Deus para o banquete do Reino… Ela está disposta a ficar apenas com “as migalhas” que caem da mesa (vers. 27); mas pede insistentemente que lhe permitam ter acesso a essa salvação que Jesus traz. Ao contrário, os fariseus e doutores da Lei, fechados na sua auto-suficiência e nos seus preconceitos, rejeitam continuamente essa salvação que Jesus não cessa de lhes oferecer.
No final de toda esta caminhada de afirmação da “bondade” e do “merecimento” desses pagãos que a teologia oficial de Israel desprezava, Jesus conclui: “Mulher, grande é a tua fé. Faça-se como desejas”. A afirmação de Jesus significa: “na verdade tu estás disposta a acolher-Me como o enviado do Pai e a aceitar o pão do Reino, o pão com que Deus mata a fome de vida de todos os seus filhos. Recebe essa salvação que se destina a todos aqueles que têm o coração aberto aos dons de Deus”.
É possível que Mateus esteja, nesta catequese, a responder a uma situação concreta da sua comunidade… Nos finais do século primeiro (o Evangelho segundo Mateus aparece durante a década de oitenta), alguns judeo-cristãos ainda tinham dificuldade em aceitar a entrada dos pagãos na Igreja de Jesus. Mateus recorda-lhes, então, que para Jesus o que é decisivo não é a raça, a história, a eleição, mas a adesão firme e convicta à proposta de salvação que, em Jesus, Deus faz aos homens.
O texto mostra que a proposta de Jesus é para todos. A comunidade de Jesus é, verdadeiramente, uma comunidade universal. Aquilo que é decisivo, no acesso à salvação, é a fé – isto é, a capacidade de aderir a Jesus e à sua proposta de vida.


* 2ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: Juízes 2, 11-19

Naqueles dias, os filhos de Israel fizeram o mal perante o Senhor e prestaram culto aos ídolos de Baal. 12Abandonaram o Senhor, Deus de seus pais, que os tinha libertado da terra do Egipto, e foram atrás dos deuses dos povos que os rodeavam; prostraram--se diante deles e ofenderam o Senhor. 13Abandonaram o Senhor e adoraram Baal e os ídolos de Astarté. 14Inflamou-se a ira do Senhor contra Israel e entregou-os nas mãos de salteadores que os espoliaram, e vendeu-os aos inimigos que os rodeavam. Eles já não foram capazes de lhes resistir. 15Para onde quer que saíssem, pesava sobre eles a mão do Senhor como um flagelo, conforme lhes havia dito e jurado; e foi muito grande a sua angústia. 16O Senhor suscitou, então, juízes que os libertaram dos seus espoliadores. 17Eles, porém, nem mesmo aos seus juízes deram ouvidos; prostituíram-se a deuses estranhos e prostraram-se diante deles. Depressa se desviaram dos caminhos que seus pais haviam trilhado, obedecendo aos preceitos do Senhor, não procederam como eles. 18Quando o Senhor lhes suscitava juízes, o Senhor estava com aquele juiz, libertando-os da mão dos seus inimigos durante toda a vida do juiz; é que o Senhor deixava-se comover pelos seus lamentos frente aos que os oprimiam e humilhavam. 19Mas, quando o juiz morria, eles voltavam a corromper-se, mais ainda que seus pais, seguindo deuses estranhos para os servir e adorar; não renunciavam aos seus crimes, nem à sua conduta pertinaz.

Evangelho: Mateus, 19, 16-22

16Naquele tempo, aproximou-se de Jesus um jovem e disse-lhe: «Mestre, que hei-de fazer de bom, para alcançar a vida eterna?» 17Jesus respondeu-lhe: «Porque me interrogas sobre o que é bom? Bom é um só. Mas, se queres entrar na vida eterna, cumpre os mandamentos.» 18«Quais?» - perguntou ele. Retorquiu Jesus: Não matarás, não cometerás adultério, não roubarás, não levantarás falso testemunho, 19honra teu pai e tua mãe; e ainda: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. 20Disse-lhe o jovem: «Tenho cumprido tudo isto; que me falta ainda?» 21Jesus respondeu: «Se queres ser perfeito, vai, vende o que tens, dá o dinheiro aos pobres e terás um tesouro no Céu; depois, vem e segue-me.» 22Ao ouvir isto, o jovem retirou-se contristado, porque possuía muitos bens.

REFLEXÃO

A história de Israel, durante o período dos Juízes, é uma história de infidelidade do povo e de fidelidade de Deus. É essa a perspectiva geral que nos oferece, logo desde o início, o livro dos Juízes.
A infidelidade do povo manifesta-se de várias formas: «os filhos de Israel fizeram o mal perante o Senhor» (v. 11), diz o livro. Esta frase é uma espécie de refrão que vai sendo repetido ao longo do livro. Mas o principal pecado foi o da idolatria: «prestaram culto aos ídolos de Baal» (v. 11). Os Israelitas, em vez de manifestarem gratidão para com Deus, procuraram outros deuses, os deuses cananeus, mais prontos a satisfazer os seus desejos. A ira de Deus não tardou a manifestar-se: «Inflamou-se a ira do Senhor contra Israel e entregou-os nas mãos de salteadores que os espoliaram» (v. 14). Deste modo, o povo de Deus voltou a uma situação de opressão e de escravidão, por sua culpa. No meio dos seus sofrimentos, voltou a recordar-se de Deus e a implorar misericórdia. O Senhor deixou-se comover e enviou-lhes os “juízes”, chefes inspirados por Ele, que tomaram conta da situação e venceram os opressores. Deus «estava com aquele juiz, libertando-os da mão dos seus inimigos» (v. 18). Infelizmente o esquema repetia-se depois da morte de cada juiz: pecado, especialmente o de idolatria, sofrimentos diversos e opressão pelos inimigos, gemidos de súplica ao Senhor, que novamente usa de misericórdia, e envia outro juiz. Assim Deus procura educar o seu povo à conversão e à confiança n´Ele, mesmo nas situações de pecado. A fidelidade de Deus leva sempre a melhor, mesmo diante da infidelidade do homem.
O evangelho mostra-nos que a fidelidade humana, mesmo quando existe, precisa de um complemento divino. O jovem, que vai ao encontro de Jesus, deseja conhecer o bom caminho para chegar à vida eterna. Jesus diz-lhe: «Se queres entrar na vida eterna, cumpre os mandamentos» (v. 17). É a fidelidade humana para alcançar a vida eterna. O jovem tinha-a observado desde sempre e pergunta: «Que me falta ainda?» (v. 20). Que falta a uma fidelidade completa? A resposta de Jesus, como acontece outras vezes, é paradoxal: «Vai, vende o que tens, dá o dinheiro aos pobres e terás um tesouro no Céu; depois, vem e segue-me» (v. 22). É como quem diz: «Não te falta nada. Tens demasiado. Falta-te tornar-te pobre de bens materiais para estares disponível para o amor divino».
O segredo para uma vida em plenitude é desfazer-se de tudo para dar lugar aos verdadeiros tesouros. É desfazer-se até de si mesmo para acolher a Cristo e a sua vida em nós: «Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim» (Gl 2, 20).
Cristo «convida-nos à bem-aventurança dos pobres, no abandono filial ao Pai» (Cst 44; cf. Mt 5, 3). Viver a bem-aventurança da pobreza é permitir a Cristo viver a Sua pobreza em nós. É, numa palavra, «viver... Cristo» (Fl 1, 21). Realiza-se a parábola do «tesouro escondido» no campo: «Um homem encontra-o e esconde-o de novo; depois, vai, cheio de alegria, vende tudo o que tem e compra aquele campo» (Mt 13, 44); a parábola da «pérola de grande valor»: o comerciante «vai, vende tudo o que tem, e compra-a» (Mt 13, 46).
O «tesouro escondido», a «pérola de grande valor» é o Cristo das bem-aventuranças, vividas na nossa vida. Por isso, «recordaremos o seu insistente convite: «Vai, vende tudo o que tens, dá-o aos pobres; depois vem e segue-Me" (Mt 19,21)» (Cst 44).


* 3ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: Juízes 6, 11-24a

Naqueles dias, 11veio, o anjo do Senhor e colocou-se debaixo do terebinto de Ofra, que era propriedade de Joás, da família de Abiézer; e Gedeão, seu filho, estava a limpar o trigo no lagar, para o esconder da vista dos madianitas. 12O anjo do Senhor viu-o e disse-lhe: «O Senhor está contigo, valente guerreiro!» 13Respondeu-lhe Gedeão: «Por favor, meu Senhor: se o Senhor está connosco, então porque é que nos aconteceu tudo isto? Onde estão todas as maravilhas que nos contavam os nossos pais, quando diziam: ‘Não é verdade que o Senhor nos fez sair do Egipto?’ Pois agora o Senhor abandonou-nos e entregou-nos nas mãos dos madianitas.» 14O Senhor voltou-se para ele e disse: «Vai com toda a tua força, e salva Israel do poder dos madianitas; sou Eu que te envio.» 15Disse-lhe ele: «Por favor, meu Senhor, como salvarei eu Israel? A minha família é a mais pobre de Manassés, e eu sou o mais jovem da casa de meu pai!» 16Disse-lhe o Senhor: «Eu estarei contigo e tu hás-de derrotar os madianitas, como se fossem um só homem.» 17Gedeão respondeu: «Se, porventura, mereci o teu favor, mostra-me por um sinal que és Tu quem fala comigo. 18Por favor te peço: Não te afastes deste lugar até que eu venha ter contigo; trarei a minha oferta e colocá-la-ei na tua presença.» Ele disse: «Eu ficarei aqui até que regresses.» 19Gedeão foi preparar um cabrito e, com uma medida de farinha, preparou pães ázimos; pôs a carne num cesto e o molho numa panela; depois, levou tudo para baixo do terebinto e ofereceu-lho. 20Disse-lhe o anjo de Deus: «Toma a carne e os pães ázimos, põe-nos sobre esta rocha e espalha o molho.» Gedeão assim fez. 21O anjo do Senhor estendeu a extremidade do bastão que tinha na mão e tocou na carne e nos pães ázimos; saiu fogo da rocha e devorou a carne e os pães ázimos. Então, o anjo do Senhor desapareceu da vista dele. 22Gedeão viu que era o anjo do Senhor e disse: «Ai, Senhor Deus, que eu vi face a face o anjo do Senhor!» 23O Senhor disse-lhe: «A paz seja contigo! Não temas: não morrerás!» 24Gedeão erigiu ali um altar ao Senhor e chamou-lhe: «O Senhor é paz.»

Evangelho: Mateus 19, 23-30

Naquele tempo, Jesus disse aos seus discípulos: «Em verdade vos digo que dificilmente um rico entrará no Reino do Céu. 24Repito-vos: É mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha, do que um rico entrar no Reino do Céu.» 25Ao ouvir isto, os discípulos ficaram estupefactos e disseram: «Então, quem pode salvar-se?» 26Fixando neles o olhar, Jesus disse-lhes: «Aos homens é impossível, mas a Deus tudo é possível.» 27Tomando a palavra, Pedro disse-lhe: «Nós deixámos tudo e seguimos-te. Qual será a nossa recompensa?» 28Jesus respondeu-lhes: «Em verdade vos digo: No dia da regeneração de todas as coisas, quando o Filho do Homem se sentar no seu trono de glória, vós, que me seguistes, haveis de sentar-vos em doze tronos para julgar as doze tribos de Israel. 29E todo aquele que tiver deixado casas, irmãos, irmãs, pai, mãe, filhos ou campos por causa do meu nome, receberá cem vezes mais e terá por herança a vida eterna. 30Muitos dos primeiros serão os últimos, e muitos dos últimos serão os primeiros.»

REFLEXÃO

Na história daqueles que se sentiram chamados a servir o povo de Deus, no sacerdócio, na vida religiosa, nos ministérios laicais, quase sempre se refere a surpresa com que receberam a vocação e a missão. Achavam-se pequenos, fracos, pecadores, indignos… Mas foi a eles que o Senhor quis chamar e enviar, garantindo-lhes a sua presença e ajuda!
É o esquema que já encontramos no Antigo Testamento, por exemplo em Moisés (Ex 3, 11), em Jeremias (Jr 1, 6) e em Gedeão, como verificamos na primeira leitura. É aparentemente estranho o modo como Deus escolhe os seus instrumentos para intervir na história do seu povo. Gedeão não é personagem de grande relevo, como ele mesmo faz notar a Deus: «Por favor, meu Senhor, como salvarei eu Israel? A minha família é a mais pobre de Manassés, e eu sou o mais jovem da casa de meu pai!» (v. 15). Porque é que Deus escolhe um instrumento tão fraco, tão desprezível, da família mais pobre e, nessa família, o filho mais novo? Quando Gedeão tiver de combater os Madianitas, irá reunir todo o povo de Israel, num total de trinta e dois mil homens armados. Porque é que Deus lhe irá dizer: «São demasiado numerosos os homens que estão contigo» (7, 2)? É verdade que os Madianitas são numerosos e fortes. Com trinta e dois mil homens armados, Israel poderia convencer-se que era pela sua força que vencia os inimigos e gabar-se: «Foi a minha mão que me salvou!» (7, 2). Por isso, Deus ordena a Gedeão que desmobilize todos aqueles que não se sintam muito fortes, muito corajosos, ou que têm qualquer objecção a pôr à mobilização geral. Dos trinta e dois mil homens, ficam apenas dez mil. «Ainda são muitos homens!», diz o Senhor (7, 4). E propõe a Gedeão uma prova surpreendente. Enquanto os seus homens bebem água de um ribeiro, Gedeão deve observar o modo como o fazem. Trezentos bebem de um modo insólito. E são os escolhidos. Os outros são despedidos, e é com este pequeno grupo que se irá manifestar o poder e a grandeza de Deus. É o modo como Deus costuma escolher os seus instrumentos.
No Novo Testamento, vemos como Deus continua a usar a mesma estratégia. Usa-a ao escolher Maria, a humilde serva do Senhor (cf. Lc 1, 34), e usa-a ao escolher os Apóstolos. Paulo, ao meditar sobre essa realidade escreve: «Trazemos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que se veja que este extraordinário poder é de Deus e não é nosso» (2 Cor 4, 7).
Se nos sentirmos fortes, a ponto de atribuirmos a nós mesmos o êxito do nosso apostolado, caímos no orgulho, e separamo-nos da fonte de todo o bem, que é o amor de Deus. Pelo contrário, aceitando a nossa condição de seres fracos, poderemos acolher toda a graça que o Senhor tem para nos dar. Paulo, debatendo-se com as suas fraquezas, suplicava ao Senhor que o livrasse delas. Mas o Senhor respondeu-lhe: «Basta-te a minha graça, porque a força manifesta-se na fraqueza» (2 Cor 12, 9).
Em vez de nos lamentarmos a nossa fragilidade, e com a fraqueza dos nossos meios, proclamemos a nossa confiança no Senhor. E Ele não deixará de manifestar a sua bondade e o seu poder em nós.


* 4ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: Juízes 9, 6-15

Naqueles dias, 6juntaram-se todos os senhores de Siquém e toda a casa de Milo, e foram proclamar rei Abimélec, junto do terebinto do monumento que está em Siquém. 7Isto foi comunicado a Jotam. E ele foi colocar-se no cimo do monte Garizim; ergueu a voz e gritou; depois, disse-lhes: «Ouvi-me, senhores de Siquém, e que Deus vos oiça! 8As árvores puseram-se a caminho para ungirem um rei para si próprias. Disseram, então, à oliveira: ‘Reina sobre nós.’ 9Disse-lhes a oliveira: ‘Irei eu renunciar ao meu óleo, com que se honram os deuses e os homens, para me agitar por cima das árvores?’ 10As árvores disseram, depois, à figueira: ‘Vem tu, então, reinar sobre nós.’ 11Disse-lhes a figueira: ‘Irei eu renunciar à minha doçura e aos meus bons frutos, para me agitar sobre as árvores?’ 12Disseram, então, as árvores à videira: ‘Vem tu reinar sobre nós.’ 13Disse-lhes a videira: ‘Irei eu renunciar ao meu mosto, que alegra os deuses e os homens, para me agitar sobre as árvores?’ 14Então, todas as árvores disseram ao espinheiro: ‘Vem tu, reina tu sobre nós.’ 15Disse o espinheiro às árvores: ‘Se é de boa mente que me ungis rei sobre vós, vinde, abrigai-vos à minha sombra; mas, se não é assim, sairá do espinheiro um fogo que há-de devorar os cedros do Líbano!’

Evangelho: Mateus, 20, 1-16a

«Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos a seguinte parábola: Reino do Céu é semelhante a um proprietário que saiu ao romper da manhã, a fim de contratar trabalhadores para a sua vinha. 2Ajustou com eles um denário por dia e enviou-os para a sua vinha. 3Saiu depois pelas nove horas, viu outros na praça, que estavam sem trabalho, 4e disse-lhes: ‘Ide também para a minha vinha e tereis o salário que for justo.’ 5E eles foram. Saiu de novo por volta do meio-dia e das três da tarde, e fez o mesmo. 6Saindo pelas cinco da tarde, encontrou ainda outros que ali estavam e disse-lhes: ‘Porque ficais aqui todo o dia sem trabalhar?’ 7Responderam-lhe: ‘É que ninguém nos contratou.’ Ele disse-lhes: ‘Ide também para a minha vinha.’ 8Ao entardecer, o dono da vinha disse ao capataz: ‘Chama os trabalhadores e paga-lhes o salário, começando pelos últimos até aos primeiros.’ 9Vieram os das cinco da tarde e receberam um denário cada um. 10Vieram, por seu turno, os primeiros e julgaram que iam receber mais, mas receberam, também eles, um denário cada um. 11Depois de o terem recebido, começaram a murmurar contra o proprietário, dizendo: 12‘Estes últimos só trabalharam uma hora e deste-lhes a mesma paga que a nós, que suportámos o cansaço do dia e o seu calor.’ 13O proprietário respondeu a um deles: ‘Em nada te prejudico, meu amigo. Não foi um denário que nós ajustámos? 14Leva, então, o que te é devido e segue o teu caminho, pois eu quero dar a este último tanto como a ti. 15Ou não me será permitido dispor dos meus bens como eu entender? Será que tens inveja por eu ser bom?’ 16Assim, os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos.

REFLEXÃO

A primeira leitura, o apólogo de Jotam apresenta-nos a monarquia de modo depreciativo, e até sarcástico. As árvores queriam um rei. Procuram uma árvore nobre, com grandes qualidades e capacidades, porque, para rei, não serve qualquer um. Dirigem-se à oliveira, que produz o azeite que alimenta, alumia e serve para preparar perfumes. Mas a oliveira recusa ser rei. Não queria «agitar-se por cima das árvores» (v. 9). Dirigem-se então à figueira, que produz tão saborosos frutos. Mas também a figueira recusa ser rei. Imploram, então, à videira: «Vem tu, então, reinar sobre nós» (v. 10). Ouvem a mesma resposta das outras árvores: não quero. Enquanto o povo tinha um alto conceito da monarquia, estas árvores tinham dela um conceito muito baixo: o rei não passava de uma árvore que se agitava sobre as outras!
A oliveira respondeu: «Irei eu renunciar ao meu óleo, com que se honram os deuses e os homens, para me agitar por cima das árvores?» (v. 9). A figueira também respondeu: «Irei eu renunciar à minha doçura e aos meus bons frutos, para me agitar sobre as árvores?» (v. 11). Assim é descrita a função do rei, a sua posição: agitar-se sobre os outros. E assim temos uma grande lição de humildade para aqueles que ambicionam o poder para estarem sobre os outros. Ser rei, ser chefe, ser superior, é uma posição de relativa esterilidade, uma vez que “mandar” não é, em si mesma, uma função produtiva. Se não houver quem trabalhe, quem faça o que é preciso, de pouco serve mandar. Mas, por outro lado, são indispensáveis administradores, dirigentes, chefes, superiores, para que os esforços produtivos dos outros contribuam para o bem comum, e não se percam, ou se oponham entre si. A autoridade deve ser um serviço efectivo à comunidade, e não um vão agitar-se sobre os outros. Nenhum grupo humano pode sobreviver sem uma cooperação recíproca, sem uma coordenação da actividade dos seus membros, sem um responsável por esta cooperação e por esta coordenação que tome, nem clima de diálogo, decisões atempadas, em ordem ao bem comum. É próprio do serviço da autoridade coordenar, controlar, decidir, caso contrário, o grupo desagrega-se na anarquia e na desordem. É por isso que as nossas Constituições afirmam: «O Superior, não sendo embora o único responsável, é o primeiro servidor desse bem comum. Estimula a fidelidade religiosa e apostólica das pessoas e da comunidade, a exemplo de Cristo-Servo que unia os seus no serviço comum ao desígnio do Pai» (Cst 56).


* 5ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: Juízes 11, 29-39a

Naqueles dias, 29o espírito do Senhor desceu sobre Jefté; Jefté atravessou Guilead e Manassés; depois, Mispá de Guilead; de Mispá de Guilead atravessou a fronteira dos amonitas. 30Jefté fez um voto ao Senhor, dizendo: «Se realmente entregas nas minhas mãos os amonitas, 31pertencerá ao Senhor quem quer que saia das portas da minha casa para me vitoriar pelo meu regresso a salvo da terra dos amonitas; eu oferecê-lo-ei em holocausto.» 32Então, Jefté marchou contra os amonitas e travou combate contra eles; o Senhor entregou-os nas suas mãos. 33Derrotou-os desde Aroer até às proximidades de Minit, tomando-lhes vinte cidades, e até Abel-Queramim; foi uma derrota muito grande; deste modo, os amonitas foram humilhados pelos filhos de Israel. 34Quando Jefté regressou a sua casa em Mispá, eis que sua filha saiu para o vitoriar, dançando e tocando tamborim; ela era filha única; não tinha mais filhos nem filhas. 35Ao vê-la, rasgou as suas vestes e disse: «Ai, minha filha! Tu fazes-me lançar no desespero! Tu és a minha desgraça! Eu falei demais na presença do Senhor; agora não posso tornar atrás.» 36Ela disse-lhe: «Meu pai, tu falaste demais na presença do Senhor; faz comigo segundo o que saiu da tua boca, pois o Senhor deu-te a vingança contra os teus inimigos, os amonitas.» 37Depois, disse a seu pai: «Concede-me o seguinte: deixa-me sozinha durante dois meses para que eu vá vaguear pelas montanhas, chorando a minha virgindade, eu e as minhas companheiras.» 38Ele disse: «Vai.» E deixou-a partir durante dois meses; ela foi com as suas companheiras e chorou sobre as montanhas a sua virgindade. 39Ao fim de dois meses, voltou para junto de seu pai; este cumpriu nela o voto que havia feito.

Evangelho: Mateus, 22, 1-14

Naquele tempo, Jesus dirigiu-se de novo aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos do povo e, falando em parábolas, disse-lhes: 2«O Reino do Céu é comparável a um rei que preparou um banquete nupcial para o seu filho. 3Mandou os servos chamar os convidados para as bodas, mas eles não quiseram comparecer. 4De novo mandou outros servos, ordenando-lhes: ‘Dizei aos convidados: O meu banquete está pronto; abateram-se os meus bois e as minhas reses gordas; tudo está preparado. Vinde às bodas.’ 5Mas eles, sem se importarem, foram um para o seu campo, outro para o seu negócio. 6Os restantes, apoderando-se dos servos, maltrataram-nos e mataram-nos. 7O rei ficou irado e enviou as suas tropas, que exterminaram aqueles assassinos e incendiaram a sua cidade. 8Disse, depois, aos servos: ‘O banquete das núpcias está pronto, mas os convidados não eram dignos. 9Ide, pois, às saídas dos caminhos e convidai para as bodas todos quantos encontrardes.’ 10Os servos, saindo pelos caminhos, reuniram todos aqueles que encontraram, maus e bons, e a sala do banquete encheu-se de convidados. 11Quando o rei entrou para ver os convidados, viu um homem que não trazia o traje nupcial. 12E disse-lhe: ‘Amigo, como entraste aqui sem o traje nupcial?’ Mas ele emudeceu. 13O rei disse, então, aos servos: ‘Amarrai-lhe os pés e as mãos e lançai-o nas trevas exteriores; ali haverá choro e ranger de dentes.’ 14Porque muitos são os chamados, mas poucos os escolhidos.»

REFLEXÃO

A primeira leitura apresenta-nos um exemplo da pedagogia divina para corrigir práticas religiosas defeituosas. Jefté, que combatia os Amonitas, desejava uma vitória clamorosa, que afastasse de vez o perigo que eles constituíam para Israel. Por isso, faz um voto ao Senhor: se Deus lhe conceder a vitória sobre os inimigos, sacrificará a primeira pessoa que encontrar, ao voltar da batalha. Este voto reflecte a mentalidade do Jefté e dos seus contemporâneos: para agradecer a Deus grandes graças, é preciso oferecer-Lhe coisas muito difíceis e custosas. O profeta Miqueias manifesta este modo de ver, quando escreve: «Com que me apresentarei ao Senhor, e me prostrarei diante do Deus excelso? Irei à sua presença com holocaustos, com novilhos de um ano? Porventura o Senhor receberá com agrado milhares de carneiros ou miríades de torrentes de azeite?» (Mq 6, 6s.). São presentes de gente grande: torrentes de azeite, milhares de carneiros… Parece-lhe que, desse modo, poderá manifestar a sua gratidão para com Deus.
Mas havia outra possibilidade, ainda mais difícil: «Hei-de sacrificar-lhe o meu primogénito pelo meu crime, o fruto das minhas entranhas pelo meu próprio pecado?» (Mq 6, 7). Oferecer o primogénito era uma ideia considerada positiva. Abraão mostrara-se disposto a fazer esse sacrifício. Deus não lho permitira, mas Abraão foi louvado por estar disposto a fazê-lo.
Jefté tinha, pois, uma disponibilidade semelhante à de Abraão: «Se realmente entregas nas minhas mãos os amonitas, pertencerá ao Senhor quem quer que saia das portas da minha casa para me vitoriar pelo meu regresso a salvo da terra dos amonitas; eu oferecê-lo-ei em holocausto» (v. 30s.). Tratava-se, evidentemente, de um erro da consciência religiosa, porque não agrada a Deus o sacrifico de uma pessoa humana. Deus quer a vida, não a morte. É o homem vivo que dá glória a Deus, dirá S. Ireneu de Lião.
Para corrigir uma ideia tão errada, Deus permitiu que a primeira pessoa a vir ao encontro de Jefté fosse a sua própria filha, que ainda por cima era única: «Não tinha mais filhos nem filhas», diz-nos o texto sagrado (v. 34). Ao fazer o seu voto, Jefté não previra uma tal possibilidade. Por isso, logo que a viu, exclamou: «Ai, minha filha! Tu fazes-me lançar no desespero! Tu és a minha desgraça! Eu falei demais na presença do Senhor; agora não posso tornar atrás» (v. 35). Na verdade, fora ele a arruinar a filha. E, mais uma vez, a sua consciência religiosa errada, não lhe permitia ver que podia ser dispensado de cumprir um tal voto. Quando se promete a Deus algo de errado, não só podemos, mas devemos deixar de cumprir a promessa. Os crentes do Antigo Testamento pensavam que, uma vez prometida uma coisa ao Senhor, não havia outro remédio senão cumpri-la. A história de Jefté visava corrigir uma tal consciência errada. Infelizmente, parece que esta consciência errada ainda subsiste em muitos cristãos, que, por vezes, fazem promessas que Deus não pode aceitar, mas que teimam em fazê-las.


* 6ª FEIRA - Anos Ímpares

Primeira leitura: Rute 1, 1-2ª.3-6.14b-16.22

1No tempo em que os Juízes governavam, uma fome assolou o país. Certo homem de Belém de Judá emigrou para os campos de Moab com sua mulher e seus dois filhos. 2Esse homem chamava-se Elimélec; sua mulher, Noemi; e os dois filhos, Maalon e Quilion. 3Entretanto, Elimélec, esposo de Noemi, morreu, deixando-a com os seus dois filhos. 4Eles tomaram para si mulheres moabitas, uma chamada Orpa e outra Rute. Viveram ali cerca de dez anos. 5Morrendo Maalon e Quilion, Noemi ficou só, sem os seus dois filhos e sem o marido. 6Então levantou-se, na companhia das duas noras, para regressar dos campos de Moab, pois ouvira dizer que o Senhor tinha visitado o seu povo e lhes tinha dado pão. 14Entretanto, Orpa beijou a sua sogra e retirou-se, mas Rute permaneceu na sua companhia. 15Noemi disse-lhe: «Vês, a tua cunhada voltou para o seu povo e para os seus deuses. Vai tu também com a tua cunhada.» 16Mas Rute respondeu: «Não insistas para que te deixe, pois onde tu fores, eu irei contigo e onde pernoitares, aí ficarei; o teu povo será o meu povo e o teu Deus será o meu Deus. 22Foi assim que Noemi voltou, e com ela a sua nora, Rute, que era originária dos campos de Moab. E chegaram a Belém, no início da colheita da cevada.

Evangelho: Mateus, 22, 34-40

Naquele tempo, os fariseus, ouvindo dizer que Jesus reduzira os saduceus ao silêncio, reuniram-se em grupo. 35E um deles, que era legista, perguntou-lhe para o embaraçar: 36«Mestre, qual é o maior mandamento da Lei?» 37Jesus disse-lhe:Amarás ao Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua mente. 38Este é o maior e o primeiro mandamento. 39O segundo é semelhante: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. 40Destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os Profetas.»

REFLEXÃO

A vida de Rute foi construída nos eventos normais do quotidiano: constituiu uma família, sofreu a perda de pessoas queridas, e tornou-se emigrante em terra estrangeira, como acontecera com Noemi. Deus está presente na sua história, e actua nela como na do povo de Israel e na dos outros povos. Noemi, pelo seu testemunho, torna-se para Rute mediação de um apelo de Deus, para que deixasse as suas tradições, a sua cultura, o seu povo, os seus deuses, para viver uma nova vida, ainda desconhecida, mas que faz parte dos desígnios insondáveis de Deus. Na sua caminhada, Rute irá conhecer novas alegrias e novos sofrimentos, a incompreensão, os conflitos, as incertezas e o sofrimento íntimo de um povo que se tornou seu. Rute acredita, responde e parte, isto é, segue o Deus da aliança a que agora pertence por dom. O Senhor escolheu-a como escolheu outras mulheres de Israel, e de outros povos, para preparar a geração de que havia de nascer o Messias. Rute terá um filho, que será testemunha de que Deus provê o seu povo, porque o ama.
A história de Rute preparou a lição do evangelho, porque demonstra como uma estrangeira, que não fazia parte do povo de Deus, e até pertencia a povo desprezado pelos Israelitas, os Moabitas, movida pelo afecto fiel e generoso pela sogra viúva e desolada, se encontrou, por isso mesmo, em relação privilegiada com Deus, tornando-se antepassada de David e, portanto, de Cristo. O amor do próximo e o amor de Deus encontraram-se estreitamente ligados. A fidelidade generosa de Rute aos afectos humanos pô-la em profunda relação com a fidelidade de Deus. O amor do próximo e o amor de Deus estão indissoluvelmente unidos


* SÁBADO - Anos Ímpares

Primeira leitura: Rute 2, 1-3.8-11; 4, 13-17

1Noemi tinha um parente por parte do seu marido, Elimélec; era um homem poderoso e rico, chamado Booz. 2Rute, a moabita, disse a Noemi: «Por favor, deixa-me ir respigar nos campos de alguém que queira acolher-me com bondade.» E ela respondeu-lhe: «Vai, minha filha.» 3Ela foi e entrou num campo, respigando atrás dos ceifeiros. Aconteceu que aquele campo era propriedade de Booz, parente de Elimélec. 8Booz disse a Rute: «Já ouviste, minha filha. Não vás respigar noutro campo; não te afastes deste e junta-te às minhas servas. 9Repara no campo por onde vão a ceifar e vai atrás delas. Pois ordenei aos meus servos que não te incomodem. E se tiveres sede, vai à bilha e bebe da água que eles tiverem trazido.» 10Rute, prostrando-se por terra, disse-lhe: «Porque encontrei tal bondade da tua parte, tratando-me como natural, a mim que sou uma estrangeira?» 11Replicando, Booz disse-lhe: «Já me contaram tudo o que fizeste pela tua sogra, depois da morte do teu marido: como deixaste o teu pai, a tua mãe e a terra onde nasceste e vieste para um povo que há bem pouco nem conhecias. 13Booz tomou, pois, Rute, que se tornou sua mulher. Juntou-se a ela e o Senhor concedeu-lhe a graça de conceber e dar à luz um filho. 14As mulheres diziam a Noemi: «Bendito seja o Senhor, que não te recusou um parente de resgate, neste dia. Que o seu nome seja proclamado em Israel. 15Ele te dará a vida e será o arrimo da tua velhice, porque nasceu um menino da tua nora, que te ama e é para ti mais preciosa do que sete filhos.» 16Noemi recebeu o menino e colocou-o no seu regaço, tornando-se a sua ama. 17As suas vizinhas, congratulando-se com ela, diziam: «Nasceu um filho a Noemi.» E deram-lhe o nome de Obed. Este foi pai de Jessé e avô de David.

Evangelho: Mateus, 23, 1-12

Naquele tempo, Jesus falou à multidão e aos seus discípulos, dizendo: 2«Os doutores da Lei e os fariseus instalaram-se na cátedra de Moisés. 3Fazei, pois, e observai tudo o que eles disserem, mas não imiteis as suas obras, pois eles dizem e não fazem. 4Atam fardos pesados e insuportáveis e colocam-nos aos ombros dos outros, mas eles não põem nem um dedo para os deslocar. 5Tudo o que fazem é com o fim de se tornarem notados pelos homens. Por isso, alargam as filactérias e alongam as orlas dos seus mantos. 6Gostam de ocupar o primeiro lugar nos banquetes e os primeiros assentos nas sinagogas. 7Gostam das saudações nas praças públicas e de serem chamados ‘mestres’ pelos homens. 8Quanto a vós, não vos deixeis tratar por ‘mestres’, pois um só é o vosso Mestre, e vós sois todos irmãos. 9E, na terra, a ninguém chameis ‘Pai’, porque um só é o vosso ‘Pai’: aquele que está no Céu. 10Nem permitais que vos tratem por ‘doutores’, porque um só é o vosso ‘Doutor’: Cristo. 11O maior de entre vós será o vosso servo. 12Quem se exaltar será humilhado e quem se humilhar será exaltado.

REFLEXÃO

Rute reconhece a sua indigência de viúva e de imigrante numa terra que não era a dela. Essa situação não a deprime. Com muita dignidade, procura ganhar o alimento para ela e para a sogra, Noemi. Para isso, pede-lhe que a autorize a ir respigar no campo de alguém que lho permita: «Deixa-me ir respigar nos campos de alguém que queira acolher-me com bondade» (v. 2). É humilhante ter que ir respigar, por não ter o necessário para viver. É humilhante estar em situação de dependência da compaixão dos outros. Rute aceita tudo com humildade, com simplicidade. Quando Booz se interessa por ela, não se mostra orgulhosa, mas prostra-se e diz: «Porque encontrei tal bondade da tua parte, tratando-me como natural, a mim que sou uma estrangeira?» (v. 10). Reconhece que não tem qualquer direito, que nada merece. Mas, por causa dessa atitude humilde, dá consigo no verdadeiro caminho para a glória divina. Tendo-se humilhado, será exaltada, terá a honra de ser mãe, e de ter como descendente David e, finalmente, Jesus Cristo.
É assim que o Antigo Testamento nos coloca no caminho da humildade, que nos permite receber os dons de Deus, com pureza de coração, e de caminhar para a plenitude da vida.
«Quem se exaltar será humilhado e quem se humilhar será exaltado», diz Jesus no evangelho (v. 12). A humildade atrai a misericórdia de Deus. A soberba afasta-a. Jesus, tão misericordioso para com os pecadores que reconhecem a sua situação, mostra-se severo para com os orgulhosos, para com aqueles que se julgam justos. Os que reconhecem o seu pecado, abrem-se ao perdão e ao amor benevolente de Deus. Para aqueles que não o reconhecem, Deus nada pode fazer. A graça não consegue penetrar na auto-suficiência dos orgulhosos, dos convencidos dos seus próprios méritos.
É por isso que Jesus critica os que fazem tudo para «se tornarem notados pelos homens» (v. 5), os que gostam dos lugares de honra, dos primeiros lugares, de serem cumprimentados... «Deus resiste aos soberbos», diz o livro dos Provérbios.

Ricardo Igreja





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